TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 78.º Volume \ 2010
214 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL redacção dada pela Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto, sem consideração de condições especiais que possam caracterizar a situação do requerente. É, portanto, este o sentido da norma do artigo 7.º, n.º 3, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, na redac ção dada pela Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto, que constitui o objecto do presente recurso. 6. A recorrente entende que a norma do artigo 7.º, n.º 3, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, na redac ção dada pela Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto, é inconstitucional por tratar de modo diverso as pessoas colectivas com fins lucrativos e as que não visam fins lucrativos, invocando que a insuficiência de meios económicos pode ocorrer em qualquer dos casos. Na verdade, embora o artigo 7.º, n.º 1, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, na redacção dada pela Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto (doravante apenas designada por Lei n.º 34/2004), diga que «têm direito a protecção jurídica (...) os cidadãos nacionais e da União Europeia, bem como os estrangeiros e os apátridas com título de residência válido num Estado-membro da União Europeia, que demonstrem estar em situação de insuficiência económica», o n.º 3 do mesmo preceito passou a prever, por força da redacção conferida pela Lei n.º 47/2007, que «as pessoas colectivas com fins lucrativos e os estabelecimentos individuais de respon sabilidade limitada não têm direito a protecção jurídica». O n.º 4 concede o direito ao apoio judiciário às pessoas colectivas sem fins lucrativos. O n.º 1 do artigo 20.º da Constituição, na redacção introduzida pela revisão constitucional de 1997, dispõe que «a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos», acres centando o n.º 2 que «todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade». Mas a verdade é que o artigo 20.º, n. os 1 e 2, da Constituição se inscreve no âmbito dos direitos funda mentais irradiantes do valor que é conferido à dignidade da pessoa humana. O acesso ao direito e à justiça é, aliás, um direito consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos e na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, o que levou o Conselho da Europa a aprovar a Resolução e a Recomendação [n.º (78)8 e n.º (93)1, respectivamente] no sentido de assegurar o acesso efectivo ao direito e à justiça das pessoas em situação de “grande pobreza”. Ora, como é sabido, os direitos fundamentais são primordialmente direitos das pessoas singulares, não sendo legítimo equiparar, a estas, as pessoas colectivas, como titulares de tais direitos. Pelo contrário, a Constituição estabelece uma limitação a tal correspondência, ao dispor no n.º 2 do seu artigo 12.º que «as pessoas colectivas gozam dos direitos e estão sujeitas aos deveres compatíveis com a sua natureza». Tal permite concluir que a Constituição não equipara as pessoas colectivas às pessoas singulares, apenas garantindo àquelas os direitos que se mostrarem compatíveis com a sua natureza. Não há dúvida de que a garantia de acesso ao direito e aos tribunais é um direito compatível com a natureza das pessoas colectivas; aliás, é bem certo que as entidades jurídicas que se dedicam a uma determinada actividade económica em busca de lucro suportam um elevado risco de se verem demandadas, ou de ter que demandar, aquelas com quem celebram os negócios que representam verdadeiramente o cerne da vida empresarial. A questão que agora nos ocupa tem precisamente a ver com a circunstância de, conforme se viu já, a lei não permitir a concessão de apoio judiciário às pessoas colectivas com fins lucrativos. 7. A evolução legislativa dá conta do paralelo que tem sido seguido, no que concerne à disciplina do apoio judiciário, pelas soluções adoptadas em matéria de custas judiciais. No domínio do Estatuto Judiciário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 22 779, de 29 de Junho de 1943 e no Decreto-Lei n.º 33 548, de 3 de Fevereiro de 1944, a assistência judiciária apenas era concedida aos “pobres”, os indivíduos que não possuíam bens ou rendimentos capazes de sustentar as despesas do pleito. O Decreto-Lei n.º 44 329, de 8 de Maio de 1962, aprovou o Código das Custas, que vigorou por mais de três décadas, até ser revogado pelo Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de Novembro. As únicas pessoas
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