TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

589 ACÓRDÃO N.º 30/10 votos fazem relevar o que nele se contém de «pré-juízo», de «prognose», sobre a séria probabilidade de o acusado vir a ser condenado pelos factos de que é acusado - “o juiz é necessariamente envolvido na acusação, sendo forçado a uma pré-compreensão (ainda que provisória) sobre a responsabilidade do acusado”, lê-se no voto de vencido do Conselheiro Vital Moreira). E, por outro lado, vincam a necessidade de o sistema não deixar “qualquer lugar para a mínima suspeita da opinião pública” sobre a imparcialidade do julgador. O Tribunal Constitucional volta a pronunciar-se no Acórdão n.º 114/95 sobre a estrutura acusatória do pro- cesso criminal e a exigência constitucional de independência dos juízes, quando chamado a ajuizar da constitucio- nalidade da norma do artigo 40.º do Código de Processo Penal de 1987, na sua versão originária. […] No aresto, depois de se citar a doutrina sustentada nos Acórdãos n. os 219/89 e 124/90 e a jurisprudência do Tri- bunal Europeu dos Direitos do Homem sobre o artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem que “reflecte a exigência de um juízo imparcial não apenas numa perspectiva subjectiva – o que o juiz pensa no seu foro íntimo em determinada circunstância é uma vertente da imparcialidade que se presume até prova em contrário – mas também numa visão objectiva, de modo a dissiparem-se quaisquer reservas: deve ser recusado todo o juiz de quem se possa temer uma falta de imparcialidade para preservar a confiança que, numa sociedade democrática, os tribunais devem oferecer aos cidadãos (...)”, escreveu-se: […] Deste acórdão retira-se em síntese que: – O artigo 40.º do Código de Processo Penal, na sua versão originária, deve ser interpretado em termos de abranger outras situações – mas não todas – em que o julgador interveio na fase do inquérito; – As garantias de imparcialidade do julgador exigem que a intervenção deste em fase de inquérito não condi- cione a sua isenção e objectividade, nem ponha em crise a confiança que o arguido e o público devem ter nessas isenção e objectividade; – Deve ser ponderado e avaliado o tipo concreto de intervenção do julgador na fase do inquérito, relevando a sua dimensão (garantística, ou não) e a fase em que ela ocorre». Percorrendo seguidamente e em detalhe as diversas interpretações normativas fiscalizadas por este Tri- bunal a propósito da aplicação do artigo 40.º do Código de Processo Penal, o Acórdão que vimos acompa­ nhando concluiu tal levantamento nos seguintes termos: “Finalmente, o Acórdão n.º 423/00, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 48.º Vol., pp. 243 e segs., versou sobre a constitucionalidade da norma do artigo 40.º do Código de Processo Penal, já na redacção dada pela Lei n.º 59/98, na interpretação que permite a intervenção como julgador do juiz que na fase de inquérito procedeu ao primeiro interrogatório do arguido, determinando a respectiva libertação mediante a adopção de medidas de coacção não privativas de liberdade e posteriormente as manteve. Uma vez mais, seguindo a fundamentação dos acórdãos anteriores, o Tribunal Constitucional considerou que aquela primeira intervenção do juiz no inquérito, “numa fase bastante embrionária do processo”, em que, citando o alegado pelo Ministério Público, “carece ostensivamente de sentido sustentar que o juiz formulou logo aí uma convicção segura sobre a culpabilidade da arguida”, não permite “que se formule uma dúvida séria sobre as suas condições de imparcialidade e isenção ou a gerar uma desconfiança geral sobre essa mesma imparcialidade e inde- pendência”.» O pensamento constitucional acabado de sintetizar dá inquestionavelmente conta de que, no mais exigente âmbito do processo penal, apenas um limitado conjunto de anteriores intervenções do juiz de julgamento é con- siderado susceptível de fazer perigar a “exigência, constitucionalmente consagrada, de imparcialidade do órgão jurisdicional (cfr. artigos 202.º, n.º 2, e artigo 266.º, n.º 2, da CRP)”. Com apoio ainda no discurso desenvolvido no Acórdão n.º 297/03, pode dizer-se que tais intervenções são, para o Tribunal, somente aquelas que hajam convertido o julgador em “órgão de acusação” ou que, pela sua

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