TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
582 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A consideração concatenada de ambos os textos em presença permite concluir que os factos que o Tribu- nal entendeu resultarem de uma «interpretação global e integrada do despacho de promoção» são rigorosa- mente aqueles que o Acórdão seguidamente enunciou (em cima a itálico) e que todos os factos em tais termos enunciados constavam já daquela peça processual, ainda que aí articulados sob diversa organização. Deste ponto de vista, a interpretação «global e integrada do despacho de promoção» serviu apenas para conden- sar numa fórmula mais compacta, sintetizada e estruturada a realidade descrita no despacho de promoção, e não, conforme sustenta o arguido, para aditar a esta quaisquer factos que a mesma não comportasse já, designadamente para o efeito da sua consideração no momento ulteriormente dedicado ao preenchimento do tipo-objectivo do ilícito. Conforme se constata a partir do excerto que o Acórdão dedicou a tal verificação, foi através dos factos previamente enunciados em estreita correspondência com a descrição contida no despacho de promoção – e não também de quaisquer outros que a esta se houvessem aditado em resultado da interpretação global e integrada do texto apresentado pelo Ministério Público – que se considerou preenchido o tipo objectivo de ilícito contra-ordenacional imputado ao arguido. 2.1.3. As considerações que o Acórdão criticado reservou ao preenchimento do tipo subjectivo do ilícito não dão conta de procedimento diverso. A este propósito, retomando a fundamentação seguida no Acórdão n.º 99/09, escreveu-se ali o seguinte: «A infracção que ao arguido se imputa é estruturalmente dolosa: o tipo legal convocado pelo despacho de promoção supõe o dolo do agente – conhecimento da factualidade típica e vontade de realização do tipo contra- ordenacional –, sendo este admitido em qualquer das modalidades que concretamente pode revestir – directo, necessário ou eventual (artigo 14.º do Código Penal, aplicável subsidiariamente por força do disposto no artigo 32.º do Regime Geral das Contra-Ordenações). Ora, lida e interpretada a versão constante do despacho de promoção, percebe-se que a mesma dá globalmente conta de uma actuação consciente, baseada no conhecimento da proibição legal – e, por consequência, no desvalor objectivo do comportamento adverso –, expressando, deste ponto de vista, o mínimo imprescindível à caracteriza- ção do nexo psicológico de ligação dos factos imputados ao respectivo agente. E se certo é que, na perspectiva da caracterização factual do dolo, outras fórmulas narrativas mais extensivas, densas e pormenorizadas serão porventura configuráveis e preferíveis até, não deixa de ser verdade que o thema pro- bandum fixado a partir do despacho de promoção não se encontra, também no que ao dolo concerne, incompleto ou impreciso ao ponto de consentir na evanescência do seu sentido e com isso comprometer a organização da de- fesa, tanto mais que o tipo legal convocado, apesar de estruturalmente doloso, não é concomitantemente integrado por qualquer um dos chamados “requisitos de intenção”». Às afirmações acabadas de transcrever o arguido coloca duas objecções, que concretiza nos seguintes termos: em primeiro lugar, «não obstante a necessidade legal do tipo em causa, o Ministério Público enten- deu não apresentar qualquer elemento probatório sobre a intenção com a qual o arguido havia alegadamente cometido o tipo contra-ordenacional», sendo que tal «omissão […] não foi tida em devida conta pelo Tri- bunal Constitucional» que também aqui recorreu a uma «indecifrável interpretação global e integrada do despacho de promoção, retirando conclusões de onde não se encontra[vam] quaisquer factos»; em segundo, «da leitura do despacho de promoção não se vislumbra» e o «Tribunal nada esclarece a este respeito, que elementos permitiram dar conta “globalmente” de uma actuação consciente, baseada no conhecimento da proibição legal – e, por consequência no desvalor objectivo do comportamento adverso». Quanto à primeira, cabe começar por esclarecer que a crítica dirigida pelo arguido encerra uma con- fusão entre o plano da descrição dos factos contidos no despacho de promoção e o da suficiência dos elemen- tos probatórios apresentados pelo Ministério Público em ordem à respectiva comprovação em juízo, sendo
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