TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
557 ACÓRDÃO N.º 171/10 Segundo o sentido comum da linguagem, a confirmação significa identidade de sentido, afirmar do mesmo modo, traduzir uma convergência; confirmar significa tornar mais certo, seguro e firme, concordar, certificar, revalidar, sancionar. A confirmação da decisão em recurso significa, assim, em leitura literal, decidir do mesmo modo, concordar, convergir ou certificar a decisão sobre que versa o recurso. A convergência ou a confirmação deve significar que não existe qualquer divergência, e que se afirma a identidade quanto aos elementos centrais e verdadeiramente constitutivos das decisões. Elementos constitutivos – elementos definidores e caracterizadores – da decisão penal condenatória são a qualificação (identificação legal do crime) e a condenação. A conformidade afasta, por sua natureza, a existência de qualquer elemento de não conformidade, desde que se refira aos elementos constitutivos das decisões. Na parte em que as decisões divirjam, não há conformidade; se não há conformidade, mesmo que parcial (isto, é, se existe não conformidade parcial), poder-se-á entender que não está integrado inteiramente o elemento nuclear da norma, que supõe convergência, certificação e concordância. Este sentido literal coincide com justificação racional da solução legal de não admissibilidade de recurso em casos de “dupla conforme”. O julgamento “conforme” em duas instâncias traduz uma presunção de bom julgamento,de julgamento certo e seguro, dispensando na proporcionalidade e racionalidade do uso dos meios processuais, uma outra apreciação em casos em que esteja em causa a aplicação de penas até ao limite definido, isto é, com um referencial de gravidade de determinado limite. Mas este pressuposto, que dá coerência à opção da lei, não se verifica quando entre uma e outra decisão existirem elementos relevantes de não conformidade, sendo arbitrária a opção interpretativa de desconsiderar, para este efeito, a não conformidade in melius , introduzindo um desequilíbrio sistémico que o rigor dos critérios de interpretação dificilmente suportará. Por isso, nesta perspectiva, e visto o conteúdo da decisão recorrida, não havia identidade do conteúdo decisório. Neste entendimento, não poderia, no caso concreto, segundo uma perspectiva aceitável, dizer-se que houve confirmação ou dupla conforme, para efeitos do disposto na alínea f ) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP. Mas a posição maioritária deste Supremo Tribunal é no sentido de que há dupla conforme quando haja confir- mação da condenação in melius , o que se teria verificado no caso presente, por o acórdão em causa ao ter absolvido o arguido da prática de um crime de burla informática e, em conformidade, reduzido a pena aplicada, ter sido mais favorável ao arguido. De acordo com esta jurisprudência o caso seria subsumível na citada alínea f ) do n.º 1 do artigo 400.º, com a consequente inadmissibilidade do recurso interposto. E se, porventura, se não considerar que há dupla conforme poderia, eventualmente, ser aplicável a alínea e) do n.º 1 do mesmo preceito que estabelece serem irrecorríveis os “acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que apliquem pena não privativa da liberdade”. Porém, o recurso também não é admissível ao abrigo desta alínea, por o arguido ter sido condenado numa pena não superior a cinco anos de prisão. Com efeito, como se disse no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Fevereiro de 2009 – Proc. n.º 102/09 - 3.ª “(...) A referência essencial para a leitura integrada do regime – porque constitui a norma que define directamente as condições de admissibilidade do recurso para o STJ – não pode deixar de ser a alínea c) do n.º 1 o artigo 432.º do CPP, que fixa, em termos materiais, uma condição e um limiar material mínimo de recorri- bilidade – acórdãos finais, proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal colectivo, que apliquem pena de prisão superior a cinco anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito. (...) A repartição das competências em razão da hierarquia pelas instâncias de recurso está, assim, delimitada por uma regra-base que parte da confluência de uma dupla de pressupostos – a natureza e a categoria do tribunal a quo e a gravidade da pena efectivamente aplicada. A coerência interna do regime de recursos para o STJ em matéria penal supõe, deste modo, que uma decisão em que se não verifique a referida dupla de pressupostos não deva ser (não possa ser) recorrível para o STJ. Com efeito, se não é admissível recurso directo de decisão proferida por tribunal singular, ou que aplique pena de prisão
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