TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

553 ACÓRDÃO N.º 168/10 Interpretação contrária é que poderia porventura pôr em causa o direito à habitação constitucionalmente tutelado do locatário, que, apesar de ver judicialmente reconhecido o direito à habitar no locado, por ser dele arrendatário, estaria impedido de executar um tal direito enquanto decorresse a discussão judicial em torno da questão de saber se assistia à senhoria o direito ou não de denunciar tal contrato. É que o direito à habitação do locador apenas pode ser processualmente exercido na respectiva na acção de despejo, só relevando a delonga desta na perspectiva constitucionalmente autónoma, que a recorrente não equacionou, do direito constitucionalmente consagrado de obter uma decisão judicial em prazo razoável (artigo 20.º, n.º 4, da CRP). E só com a procedência definitiva da acção é que opera o efeito extintivo da denúncia, cessando, com tal fundamento, a própria relação locatícia que até esse momento legitimou a afectação do locado às necessidades habitacionais do locatário. Até lá, o que existe juridicamente e merece tutela constitucional é, tão-só – sublinhe-se de novo –, o vínculo obrigacional constituído por efeito do contrato de arrendamento para habitação que une senhoria e inquilino, cujo conteúdo integra, como pólo activo, o direito do locatário a habitar o locado e, como pólo passivo, a obrigação do locador de proporcionar, nas condições contratualmente estipuladas e exigidas por lei, o exercício, pelo locatário, de tal direito. E é essa circunstância que justifica que não possa relevar, sem mais, a mera invocação do direito de propriedade, tal como está consagrado no artigo 62.º da Constituição. Por tudo isso, não é constitucionalmente ilegítima a interpretação que não reconhece à simples instauração da acção de despejo, com o fundamento invocado (denúncia para habitação), ainda que nos termos da lei do processo e com a antecedência legalmente imposta, relevância extintiva ou, mesmo modificativa,da obrigação exequenda de entrega que recai sobre o senhorio que já se encontra, de facto, na posse do locado. III — Decisão Pelo exposto, decide-se: a) Não julgar inconstitucionais as normas dos artigos 1 101.º, alínea a) , do CC, e 814.º, alínea g) , do CPC, quando interpretadas no sentido de que a mera instauração, ainda que com a antecedência mínima de seis meses imposta por lei, da acção de despejo, com fundamento no direito de denúncia para habitação do senhorio, não constitui facto extintivo ou modificativo da obrigação exequenda de entrega do locado, pelo senhorio, que já esteja na posse do mesmo, podendo apenas vir a sê-lo com a procedência da acção; b) E, consequentemente, negar provimento ao recurso. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta. Lisboa, 28 de Abril de 2010. – Carlos Fernandes Cadilha – Vítor Gomes – Ana Maria Guerra Martins – Maria Lúcia Amaral – Gil Galvão. Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República, II Série, de 28 de Junho de 2010. 2 – Os Acórdãos n.ºs 101/92, 322/93, 223/95 e 121/97 estão publicados em Acórdãos , 21.º, 25.º, 30.º e 36.º Vols., respec- tivamente.

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