TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
538 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL seria, no caso, a solução razoável, justa e oportuna (cfr. Acórdão da Comissão Constitucional, n.º 458, de 25 de Novembro de 1982, in Apêndice ao Diário da República , de 23 de Agosto de 1983). O controlo do Tribu- nal é antes de carácter negativo, cumprindo-lhe tão-somente verificar se a solução legislativa se apresenta em absoluto intolerável ou inadmissível, de uma perspectiva jurídico-constitucional, por para ela se não encon- trar qualquer fundamento inteligível. Como foi salientado, entre muitos outros, nos Acórdãos n.ºs 186/90, 187/90 e 188/90 (qualquer deles disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) , «o princípio da igualdade, entendido como limite objectivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a realização de distinções. Proíbe-lhe, antes, a adopção de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, ou seja, desigualdades de tratamento materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável ( vernünftiger Grund ) ou sem qualquer justificação objectiva e racional. Numa perspectiva sintética, o princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se na ideia geral de proibição do arbítrio ( Willkürverbot )». No que especificamente respeita à razoabilidade de diferenciação de regimes com base na relevância do interesse público subjacente à eficiência do sistema fiscal, ainda que versando norma diferente da dos autos, decidiu o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 345/06, que: […] atento o interesse público subjacente à actividade da cobrança dos impostos, cuja eficiência é essencial para o regular funcionamento dos serviços públicos, vocacionados à satisfação de necessidades colectivas, não surge como inadequada, irracional ou desajustada a solução de só consentir a sustação da execução fiscal perante um despacho judicial que ou determine o prosseguimento do processo de recuperação da empresa executada ou decrete a sua falência, não deixando o normal andamento da execução fiscal inteiramente dependente do mero requerimento por um credor desse tipo de processos, sem prévio controlo judicial, por mais perfunctório que seja, da sustentabilidade desse requerimento. A não aplicabilidade do regime do artigo 870.º do CPC ao processo de execução fiscal explica‑se, assim, pelo interesse público ínsito na cobrança de créditos através do processo de execução fiscal, que recomenda que não se coloque na disponibilidade das partes, independentemente de qualquer intervenção judicial, a possibilidade de suspensão do processo, que tem como corolário um prejuízo para aqueles interesses. A razoabilidade de diferenciação de regimes com base na relevância do interesse público subjacente à eficiência do sistema fiscal, revelado quer em normas de natureza substantiva, quer de índole adjectiva, tem sido reiterada- mente salientada por este Tribunal. Assim, no Acórdão n.º 153/02, que não julgou inconstitucional a norma da primeira parte do n.º 1 do artigo 736.º do Código Civil, que outorga ao Estado um privilégio mobiliário geral, para garantia de créditos fiscais provenientes de IVA e respectivos juros compensatórios, considerou‑se não ser “arbitrária, irrazoável ou infundada – e, como tal, violadora do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição – a consagração de tal privilégio a favor do Estado”, pois se trata “de uma medida legislativa jus- tificável atentas as múltiplas funções do Estado – económicas, sociais e culturais –, funções estas que exigem uma cobrança, rápida e segura, das receitas provenientes das contribuições e impostos para cobrir as despesas públicas com aumento constante”, que “atentas as finalidades subjacentes ao sistema fiscal”, torna “justificável a quebra da regra da par conditio creditorum , a que a norma ora em causa procede”. Ou nos Acórdãos n.ºs 302/97, 303/97, 213/98, 251/98 e 355/98, que não julgaram inconstitucional a norma do artigo 35.º, n.º 1, do Código de Processo Tributário, que estabelecera um prazo prescricional de cinco anos para as contra‑ordenações fiscais, superior ao do regime geral, consignando‑se que a aludida diferenciação de prazos não “encerra uma desigualdade de tratamento arbitrária, sem fundamento razoável ou material bastante dos arguidos em processos de contra‑ordenação fiscal em comparação com os arguidos em outros processos de contra‑ordenação”, considerando‑se, além do mais, que «a relevância das funções cometidas pela Lei Fundamental ao “sistema fiscal” (artigos 106.º e 107.º da Constituição da República Portuguesa) constituirá suporte material bastante para legitimar o estabelecimento de um regime especial de prescrição do procedimento contra‑ordenacional fiscal menos favorável aos infractores, dificultando e desincentivando a fuga ao cumprimento dos deveres fiscais – essenciais à satisfação das necessidades financeiras do Estado e demais entidades públicas e à realização de relevantes objectivos de justiça social».
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