TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

536 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 7. Já o direito de acesso aos tribunais surge violado pela circunstância de entre a frustração da venda por propostas em carta fechada e a consumação da venda por negociação particular vigorar a arcana praxis da Ad- ministração Fiscal, o que tem como efeito que o credor reclamante desconhece o momento temporalmente adequado para intervir na venda do bem, assim ficando privado de desencadear qualquer actuação processual tendente a acompanhar a venda e, consequentemente, de defender a efectivação da garantia patrimonial do seu crédito. Por via do secretismo da actuação da Administração Fiscal e em face da dispensa de notificação, o credor reclamante com garantia real vê ser-lhe negado o direito ao contraditório e a um processo justo e equitativo. Os recorridos não apresentaram contra-alegações. II — Fundamentação 8. Nos processos de execução fiscal, a execução não pode prosseguir se não forem citados os credores que detenham garantias reais relativamente aos bens penhorados. É o que determina o Código de Procedimento e de Processo Tributário, que confere ainda, aos referidos credores, um prazo de quinze dias após a citação para que possam reclamar os seus créditos (artigos 239.º e 240.º do CPPT). Em regra geral, e neste tipo de processos, a venda de bens penhorados faz-se por meio de propostas em carta fechada, conforme dispõe o artigo 248.º do CPPT. A disposição, introduzida por redacção da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, veio pôr termo ao regime anteriormente vigente, nos termos do qual se admitia, neste tipo de processos, a venda por arrematação em hasta pública, sempre que o órgão de execução fiscal, em despacho fundamentado, sustentasse a manifesta vantagem da adopção dessa modalidade de venda, tendo em conta a natureza dos bens a penhorar e uma vez assegurada a transparência da operação . Com esta mudança de regime, efectuada em 2001, terá querido o legislador ordinário dificultar o conluio entre potenciais compradores que o processo de venda em hasta pública sempre possibilitaria. Semelhante intenção, manifestada na reforma do processo de execução comum (que veio a proibir, tam- bém, a adopçãodessa modalidade de venda: veja-se o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro), justificar-se-ia, por maioria de razão, em processo de execução fiscal, que, prosseguindo o inte­ resse público da cobrança de impostos, não pode deixar de ser ordenado de modo a garantir a transparência de todas as operações. Ao impor, como regra geral, a venda feita por meio de propostas em carta fechada, pretendeu portanto o legislador assegurar que, neste tipo de processo, as acções de venda se realizassem num contexto inquestionável de “regularidade”. A regra tem, no entanto, excepções. De acordo com o artigo 248.º do CPPT, a venda é feita desse modo [por meio de propostas em carta fechada] “salvo quando diversamente se disponha na presente lei”. A disposição diversa é a que consta do artigo 252.º, que determina que a venda se faça por outra das modali- dades previstas no Código de Processo Civil quando “no dia designado para a abertura de propostas se verifi- car a inexistência de proponentes ou a existência de propostas de valor inferior ao valor de base anunciado”. Foi precisamente a inexistência de propostas o que ocorreu no caso em juízo. As outras modalidades a que se refere o artigo 252.º [do CPPT] são as que constam do artigo 886.º do Código de Processo Civil: venda em bolsa de capitais ou mercadorias; venda directa a pessoas ou entidades; venda por negociação particular; venda em estabelecimento de leilões; venda em depósito público ou equi- parado; venda em leilão electrónico. No caso, a Administração Fiscal decidiu escolher a modalidade da venda por negociação particular. Nos termos do regime de execução comum, os credores reclamantes de créditos com garantia sobre os bens a vender são sempre ouvidos quanto à escolha da modalidade da venda e quanto à fixação do valor base dos bens. É o que decorre do artigo 886.º-A do Código de Processo Civil (CPC), que determina que

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