TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

508 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Em todo este condicionalismo, a recorrente, tendo aderido ao regime de regularização de dívidas fiscais através do pagamento em 150 prestações mensais, não poderia invocar qualquer expectativa legítima relati- vamente à possibilidade de o prazo prescricional entretanto suspenso vir a ser retomado sempre que deixasse de cumprir pontualmente qualquer das prestações a que se obrigou. O que seria de esperar era que a recor- rente, tal como se comprometeu, viesse a proceder ao pagamento atempado de todas as prestações abrangidas pelo plano de regularização, e era nesse compromisso que assentava a relação estabelecida entre o devedor e a Administração, assim se compreendendo que esta tivesse vindo a introduzir mecanismos administrativos de flexibilização do regime legal, de modo a permitir, em benefício dos contribuintes faltosos, a relevação dos atrasos nos pagamentos periódicos para evitar, no imediato, a consequência mais gravosa de cobrança coerciva das dívidas através do reatamento dos processos de execução fiscal. Em qualquer caso, era plenamente justificável que a posição jurídica do contribuinte que tenha ade- rido ao regime de diferimento do pagamento de dívidas apenas viesse a ser alterada após a verificação, pelos serviços, da respectiva situação tributária e mediante a prática de um acto revogatório da autorização concedidapara a aplicação desse regime, com base na constatação da efectiva impossibilidade de o interes- sado regularizara sua situação pelas formas de pagamento excepcionalmente admitidas na lei. Neste plano, deve dizer-se que acto que exclui o devedor do regime de pagamento diferido não é, de nenhum modo, um acto de exercício discricionário já que ele tem de ter sempre como fundamento o incum- primento, por parte do devedor, das obrigações a que se sujeitou, pelo que é um acto vinculado quanto ao conteúdo e pressupostos. Além de que a não exclusão do devedor do regime de regularização de dívidas tem como necessária consequência, enquanto essa situação se mantiver, a impossibilidade de virem a prosseguir contra este os processos de execução fiscal que se encontram suspensos por efeito da sua adesão a esse regime. Estando a Administração impedida de assegurar a cobrança coerciva das dívidas fiscais, por virtude do prolongamento da aplicação do procedimento previsto no Decreto-Lei n.º 124/96, não é possível imputar à inércia adminis­ trativa a impossibilidade de realização efectiva do direito. E não há, nestes termos, qualquer afectação de expectativas que possam encontrar-se abrangidas pelo princípio da protecção da confiança, porquanto a recorrente não pode razoavelmente contar com a cessação do efeito suspensivo da prescrição antes de ter sido formalmente liberado do regime legal a que tinha aderido e quando, por virtude dele, estava ainda a coberto de qualquer mecanismo de cobrança forçada. Por todas as razões já expostas, a interpretação normativa adoptada pelo tribunal recorrido não repre- senta também qualquer violação do princípio da proporcionalidade. Mesmo entendendo o instituto da prescrição das dívidas tributárias como uma garantia dos contribuintes, como vem sendo aceite pela doutrina (Benjamim Silva Rodrigues, “A Prescrição no Direito Tributário”, in Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Lisboa, 1999, pp. 261 e segs.; Casalta Nabais, Direito Fiscal, 5.ª edição, Coimbra, p. 347), não pode deixar de concluir-se que a suspensão do prazo da prescrição é, no circuns­ tancialismo do caso, uma medida necessária e idónea para a prossecução dos fins visados pela lei, dado que a solução normativa contrária traria inevitavelmente a extinção, pelo decurso do tempo, dos créditos fiscais e a consequente impraticabilidade do regime legal, que tem em vista a compatibilização dos interesses financeiros do Estado. Nem se trata, no caso, de um condicionamento desproporcionado ou excessivoquando é certo que, como se deixou esclarecido, o efeito suspensivo deriva de um acto voluntário do contribuinte, que, no seu próprio interesse, se sujeita à aplicação de um regime mais favorável de pagamento faseado das dívidas fiscais,

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