TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

499 ACÓRDÃO N.º 134/10 – já se incluem , “substancial” ou “naturalmente”, nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 280.º da Constituição, e nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional. Duvido que assim seja. É para mim evidente que sendo, no contencioso de responsabilidade do Estado, a invalidade do acto legis­ lativo pressuposto do dever público de indemnizar, a condenação do Estado (ou a sua absolvição) pressuporá um juízo prévio que, por “natureza” ou “substância”, pertencerá sempre ao núcleo de competências próprias do Tribunal Constitucional. Como decidir sobre a “ilicitude” de uma lei – ou seja, julgar a sua consti­ tucionalidade ou legalidade – é, sempre , administrar a justiça em matérias jurídico-constitucionais, nada legitimaria que este tipo de decisões, quando tomadas em acções de responsabilidade, se furtassem ao con- trolo do Tribunal ao qual compete especificamente realizar a justiça constitucional. Porém, o modelo de recursos que a Constituição da República desenha – e que a Lei do Tribunal Constitucional replica – funda-se em princípios claros, que resultam da conjugação dos artigos 3.º, n.º 3, e 204.º Como não são válidas as normas contrárias à Constituição (artigo 3.º, n.º 3), o juiz, que conhece o Direito, não pode (não deve) aplicá-las nos feitos submetidos a julgamento (artigo 204.º). É dessa decisão, que pressupõe a composição de um certo litígio de acordo com uma norma de cuja constitucionalidade se duvida, que cabe recurso para o Tribunal. Não me parece que o juízo sobre a “ilicitude” de uma lei, feita em acção de responsabilidade do Estado, possa ser tido simplesmente como um continuum dos recursos para o Tribunal desenhados, pelas razões que acabei de expor, no n.º 1 do artigo 280.º da CRP. No meu entender, ele é outra coisa, dado que se não traduz na composição de um litígio com fundamento em norma de cuja constitucionalidade se duvida. Nas situações do artigo 280.º, o tema a decidir não é a censura do poder legislativo. Tal censura aparece, como bem se sabe, incrustada incidentalmente na questão principal, de direito infraconstitucional, que tem que ser decidida. Nas acções de responsabilidade por ilícito legislativo o thema decidendum é a censura do legislador. E uma censura ainda mais intensa do que aquela que é feita em sede de controlo puro de constitucionalidade, visto que se não destina apenas a accertare a invalidade de uma escolha do poder legislativo. Partindo dessa invalidade, a acção de responsabilidade (por ilícito legislativo) destina-se a eventualmente repartir os custos da escolha legislativa censurável por toda a comunidade política, de modo a ressarcir o “prejudicado”. O tema é, pois, a censura do legislador, e uma censura que, no seu significado constitucional e jurídico‑político, ganha contornos de gravidade ou de intensidade que não são compartilhados pelos juízos de inconstitu- cionalidade de normas, formulados em processos de fiscalização concreta. É por tudo isto que a decisão de inconstitucionalidade que é tomada, pelo tribunal comum, em acção de responsabilidade, não equivale, a meu ver, àquela outra que é tomada pelo mesmo tribunal em processo de fiscalização concreta. Não estamos aqui perante coisas idênticas. Estamos perante algo (na acção de responsabilidade) que é um plus face ao já existente, e que, em última análise, se traduzirá em um novo modo de acesso directo dos particulares à justiça constitucional. – Maria Lúcia Amaral. Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República, II Série, de 8 de Junho de 2010. 2 – Os Acórdãos n.ºs 237/86, 339/87, 71/92, 323/93, 10/95, 20/97, 25/01 e 374/04 estão publicados em Acórdãos, 8.º, 10.º, 21.º, 25.º, 30.º, 36.º, 49.º e 59.º Vols., respectivamente. 3 – Os Acórdãos n.ºs 90/84 e 102/84 estão publicados em Acórdãos , 4.º Vol. 4 – Os Acórdãos n.ºs 35/96, 379/96 e 584/96 estão publicados em Acórdãos, 33.º Vol.

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