TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

498 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL legislador, cuja presença pode ser interpretada, numa visão global do sistema, no sentido de relativizar ou suavizar as exigências a este impostas na fase de criação, não dispensam a fixação de parâmetros e critérios suficientementedensificados de imputação de bens, direitos, obrigações e encargos logo no acto de criação do novo município. Deste modo, o elemento teleológico de interpretação da lei corrobora o elemento literal e sistemático, levando à conclusão de que não devem interpretar-se os artigos 11.º e 15.º da Lei n.º 48/99 como revogando tacitamente (ou através da fórmula genérica da parte final do artigo 19.º) as exigências de conteúdo da lei de criação de cada novo município que são impostas pela alínea b) do artigo 9.º da Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro. Não podendo considerar-se revogadas as normas paramétricas consideradas violadas, desaparece o substrato das demais questões hipotéticas acima enunciadas (legalização superveniente e retroactiva da Lei n.º 83/98). Conclui-se, portanto, no sentido da ilegalidade da norma do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 83/98, de 14 de Dezembro, que criou o município da Trofa, por violação da alínea b) do artigo 9.º, com referência às alíneas e) e f ) do n.º 1 do artigo 8.º da Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro – lei com valor reforçado. Consequentemente, o recurso improcede. III — Decisão Nestes termos, decide-se julgar improcedente o recurso, confirmando-se o juízo de ilegalidade formulado na decisão recorrida. Sem custas. Lisboa, 14 de Abril de 2010. – Vítor Gomes – Ana Maria Guerra Martins – Maria Lúcia Amaral (com declaração) – Carlos Fernandes Cadilha – Gil Galvão. DECLARAÇÃO DE VOTO Votei, sem nenhuma dúvida, a resposta que neste caso foi dada ao problema de saber se o Tribunal deveria conhecer do recurso interposto pelo Ministério Público. Subscrevi sem hesitação o raciocínio seguido, quanto a este ponto, pelo Acórdão, segundo o qual “todas as razões que, num sistema difuso de controlo da constitucionalidade, justificam a existência de um recurso das decisões dos (demais) tribunais para o Tribunal Constitucional (…) estão presentes perante decisões de contencioso de responsabilidade fundado em ilícito legislativo”. No entanto, não posso deixar de exprimir reservas quanto à afirmação segundo a qual existirá uma equivalência de natureza ou de substância entre a decisão judicial que não aplica norma com fundamento em inconstitucionalidade ou ilegalidade (ou a decisão judicial que a aplica, não obstante a questão de cons­ titucionalidade ou de legalidade ter sido suscitada durante o processo) e a decisão judicial que condena o Estado ao pagamento de uma indemnização por prejuízos causados por actos legislativos que sejam “ilícitos”. A afirmação ocupa, no percurso argumentativo do Tribunal, um lugar de relevo, visto que é por causa dela que se conclui que os recursos interpostos para o Tribunal de decisões relativas ao contencioso da responsabi- lidade – quer de decisões que condenem o Estado, por nelas se ter dado como verificado o pressuposto da “ilicitude” da lei; quer de decisões que o absolvam, por nelas se não ter dado como perfeito tal pressuposto

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