TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
489 ACÓRDÃO N.º 134/10 face à revisão de 1989, considerava que o valor reforçado das leis podia advir quer da sujeição a um procedimento agravado, quer da atribuição de uma função paramétrica (“leis interpostas”). Resulta, com efeito, da actual redacção do n.º 3 do artigo 112.º da CRP que se prevêem quatro espécies de leis com valor reforçado, as duas primeiras tendo na base critérios “formais ou procedimentais” e as duas últimas assentando em critérios “materiais”: 1) as leis orgânicas, isto é, nos termos do artigo 166.º, n.º 2, as leis da Assembleia da República que versem sobre: eleições dos titulares dos órgãos de soberania; regimes dos referendos; organização, funcionamento e pro- cesso do Tribunal Constitucional; organização da defesa nacional, definição dos deveres dela decorrentes e bases gerais da organização, do funcionamento, do reequipamento e da disciplina das Forças Armadas; regimes do estado de sítio e do estado de emergência; aquisição, perda e reaquisição da nacionalidade portuguesa; associações e par- tidos políticos; eleições dos deputados às Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da Madeira; eleições dos titulares dos órgãos do poder local; regime do sistema de informações da República e do segredo de Estado; regime de finanças das regiões autónomas; e criação de regiões administrativas; 2) as leis que carecem de aprovação por maioria de dois terços, isto é, nos termos do artigo 168.º, n.º 6: a lei que regula o exercício do direito de voto para a eleição para Presidente da República dos cidadãos por- tugueses residentes no estrangeiro; as disposições das leis que regulam a composição da Assembleia da República e os círculos eleitorais; as disposições das leis que regulam as restrições ao exercício de direitos por militares e agentes militarizados dos quadros permanentes em serviço efectivo, bem como por agentes dos serviços e forças de segu- rança; e as leis relativas ao sistema e método de eleição dos órgãos executivos colegiais das autarquias locais; 3) as leis que, por força da Constituição, sejam pressuposto normativo necessário de outras leis; e 4) as leis que, por força da Constituição, devam ser respeitadas por outras leis. Nestes dois últimos casos, a Constituição prevê uma relação de pressuposição e de parametricidade entre nor- mas, que constitui excepção face à regra geral, instituída no n.º 2 do artigo 112.º, do igual valor entre as leis e os decretos-leis. Também esta nova formulação tem originado entendimentos não inteiramente coincidentes por parte da doutrina (cfr. as “Opiniões” de Carlos Blanco de Morais, J. J. Gomes Canotilho, Jorge Bacelar Gouveia, Jorge Miranda, Manuel Afonso Vaz, Maria Lúcia Amaral e Paulo Otero, in Legislação – Cadernos de Ciência de Legislação , n.º 19/20, Abril/Dezembro de 1997, pp. 9-147, em especial pp. 23‑30, 42‑43, 59‑61, 70‑81, 98‑100, 111‑114 e 129‑132, respectivamente; J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição , 7.ª edição, Alme- dina, Coimbra, 2003, pp. 781‑785; Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional , Tomo V – Actividade Cons titucional do Estado , 2.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2000, pp. 349‑369, e “Sobre os actos legislativos em Portugal após a revisão constitucional de 1997”, in Seminário Permanente de Direito Constitucional e Administrati vo , vol. I, Associação Jurídica de Braga / Departamento Autónomo de Direito da Universidade do Minho, 1999, pp. 5‑33, em especial pp. 21‑24; José Magalhães, Dicionário da Revisão Constitucional , Editorial Notícias, Lisboa, 1999, p. 141; Marcelo Rebelo de Sousa e José de Melo Alexandrino, Constituição da República Portuguesa Comen tada , Lex, Lisboa, 2000, pp. 227‑228; Alexandre Sousa Pinheiro e Mário João de Brito Fernandes, Comentário à IV Revisão Constitucional , Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, Lisboa, 1999, pp. 277‑300, em especial pp. 292‑300; e, por último, Florence Cruz, L’Acte Législatif en Droit Comparé Franco‑Portugais , Presses Universitaires d’Aix‑Marseille / Economica, 2004, pp. 652‑681). Na citada “Opinião” ( Legislação , n.ºs 19/20, p. 42), J. J. Gomes Canotilho refere: “Perante a indeterminação do conceito de leis reforçadas introduzida pela 2.ª revisão da Constituição, a Lei Constitucional n.º 1/97 pretendeu eliminar algumas dúvidas através da densificação jurídico‑constitucional de tal conceito. (...) No artigo 112.º, n.º 3, recortam‑se quatro categorias de leis reforçadas articulando critérios muito heterogéneos para a sua caracterização. Por um lado, recorre‑se a critérios funcionais‑formais para identificar como leis reforçadas as leis orgânicas e as leis que carecem de aprovação por uma maioria de dois terços. Por outro lado,
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