TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

480 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Dezembro – que delegou na comissão instaladora do novo município, prevista no artigo 3.º da mesma Lei, a competência para elaborar a relação discriminada de bens e relações jurídicas a transferir –, excluindo do âmbito do recurso as normas da Lei n.º 48/99, de 16 de Junho [artigos 4.º, n.º 1, alínea h) , 11.º, n.º 1, 15.º e 17.º]. Tal conclusão retira-se, desde logo, da aceitação pelo recorrente de que o Supremo não recusou aplicar quaisquer disposições constantes da Lei n.º 48/99, de 16 de Junho, quando afirma “não vislumbrar no acórdão recorrido qualquer linha argumentativa que, de forma expressa ou implícita, pudesse envolver a desaplicação de quaisquer preceitos constantes de tal diploma legal”. E, se dúvidas houvesse, essa redução é expressamente assumida no requerimento de resposta às questões prévias suscitadas pelo requerido, em que reafirma aquele seu entendimento. Deste modo, considera-se o objecto do recurso restrito à referida norma do artigo 4.º, n.º 1, da Lei n.º 83/98, de 14 de Dezembro, cuja aplicação foi recusada, com fundamento em violação da Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro, tida como “lei com valor reforçado”. 5 . Admissibilidade do recurso 5.1. O acórdão recorrido foi proferido no âmbito de uma acção indemnizatória movida ao Estado Português pelo município de Santo Tirso, fundada na existência de danos imputados ao ilícito legislativo consubstanciado na emissão da Lei n.º 83/98, de 14 de Dezembro, que criou o município da Trofa, com violação de preceitos constantes da Lei n.º 142/85 (Lei Quadro da Criação de Municípios), considerada lei de valor reforçado relativamente ao acto legislativo de criação concreta de autarquias locais. Neste acórdão, o Supremo Tribunal de Justiça, aderindo, no essencial, às decisões das instâncias (sentença do Tribunal da comarca de Santo Tirso e acórdão do Tribunal da Relação do Porto), entendeu que a Lei n.º 83/98, ao não observar o disposto nos artigos 8.º e 9.º da Lei n.º 142/85, omitindo as menções constantesdas alíneas e) e f ) daquele artigo 8.º, causou prejuízos que o município de Santo Tirso “teve de suportar e foi supor­ tando em consequência do sobredimensionamento dos quadros de funcionários e serviços que teve de manter, após a criação e instalação do município da Trofa não obstante a substancial diminuição quer da população quer da área resultante da amputação territorial e populacional que a criação do novo município implicou”. Para o acórdão recorrido, a solução prevista no artigo 4.º pela Lei n.º 83/98 de atribuir à comissão instaladora prevista no seu artigo 3.º a competência para elaborar uma relação discriminada dos bens, universalidades de direitos e obrigações do município de Santo Tirso a transferir para o novo município, além de não ter apoio na Lei Quadro que não previa a delegação de competência nessa matéria, comportava um desfasamento temporal de consequências lesivas por deferir soluções que já deveriam constar desse acto legislativo, ou seja, “a Lei Quadro impunha que fosse o acto criador do município a estabelecer, desde logo, a discriminação dos bens e direitos a transferir e a enunciação de critérios tanto quanto precisos para sua afectação e imputação ao novo município”. Assim, concluiu, que – não afectando embora o acto de criação do novo município – essa desconformidade “envolve responsabilidade civil do Estado a qual decorre, como geralmente se vem entendendo, do artigo 22.º da CRP”. Em síntese, o acórdão recorrido dá como assente a ilegalidade do artigo 4.º, n.º 1, da Lei n.º 83/98, por violação de lei com valor reforçado – a Lei n.º 142/85 –, e é com base na ocorrência dessa desconformidade com a lei de valor paramétrico que tem por verificado um dos pressupostos de que depende a efectivação da responsabilidade civil do Estado no exercício da actividade legislativa. Em face desta decisão, é pertinente a dúvida quanto ao preenchimento dos pressupostos do tipo de recurso em presença, justificando a questão prévia suscitada pelo recorrido nas suas contra-alegações, designadamente, quanto afirma que nunca o Supremo Tribunal de Justiça deixou de aplicar a Lei n.º 83/98, salientando que as denominadas “falsas recusas” de aplicação de normas jurídicas não são recorríveis. Esta posição do recorrente é desenvolvida em parecer jurídico junto aos autos, onde se suscitam reservas sobre

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