TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

477 ACÓRDÃO N.º 134/10 Tal prejuízo liga-se à inobservância, pelo Estado, através da Lei n.º 83/98, dos artigos 9.º e 8.º da Lei n.º 142/85 que omitiu as menções constantes das alíneas e) e f ) daquele artigo 8.º que impunham a: e) discriminação, em natureza, dos bens, universalidades, direitos e obrigações do município de origem a transferir para o novo muni­ cípio e f ) a enunciação de critérios suficientemente precisos para afectação e imputação ao novo município, de direitos e obrigações. Como bem assinalam as instâncias, a Lei n.º 83/98 pretendeu remediar tal omissão através do artigo 4.º que atribuiu à comissão instaladora prevista no seu artigo 3.º, a competência para elaborar uma relação discriminada dos bens, universalidades de direitos e obrigações do município de Santo Tirso a transferir para o novo município. Mas a solução prevista pela Lei n.º 83/98 para além de brigar com a Lei Quadro que não prevê a delegação de competência nessa matéria, comporta um desfasamento temporal por diferir soluções que já deveriam estar nesse acto legislativo, ou seja, a Lei Quadro impunha que fosse o acto criador do município a estabelecer, desde logo, a discriminação dos bens e direitos a transferir e a enunciação de critérios tanto quanto precisos para sua afectação e imputação ao novo município. Não o fez e daí resultou um elemento de ilicitude que – não afectando embora o acto de criação do novo município, como de forma brilhante e com notável profundidade conclui o douto julgador da primeira instância, com inteira concordância da Relação – envolve responsabilidade civil do Estado a qual decorre, como geralmente se vem entendendo, do artigo 22.º da Constituição da República Portuguesa (CRP). No recurso não é posto em causa o montante, apurado nas instâncias, do prejuízo que a sobredimensão fun- cional causou ao autor. Por isso e porque se trata de matéria alheia ao objecto do recurso, nenhuma objecção se pode levantar a propósito. De tudo decorre a falta de fundamento das conclusões do recurso. Nestes termos, negam a revista sem custas por delas estar isento o recorrente.» 3. Remetidos os autos ao Tribunal Constitucional foram as partes notificadas para alegações, tendo o Ministério Público apresentado as que constam de fls. 1720 a 1724, nas quais, além do mais, delimita o objecto do recurso, nos seguintes termos: «O presente recurso vem interposto pelo Ministério Público do acórdão, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito da acção indemnizatória movida ao Estado Português pelo município de Santo Tirso, com fundamento na “ilicitude” do acto legislativo consubstanciador da criação do município da Trofa, – a Lei n.º 83/98 – alegadamente violador de preceitos constantes da Lei Quadro de criação de municípios – a Lei n.º 142/85 – tida como dotada de “valor reforçado” relativamente àquele primeiro acto normativo. Fundando-se o recurso na alínea c) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, importa começar por verificar se o acórdão recorrido terá recusado aplicar normas constantes de acto legislativo, alegadamente violados de “lei com valor reforçado”, delimitando-lhe o objecto. O acórdão proferido pelo Supremo – aderindo, no essencial, a precedentes decisões das instâncias – não põe obviamente em causa a “validade” e a “eficácia” do acto legislativo concreto de criação, pela Assembleia da Repú­ blica, do município da Trofa: pelo contrário, configurando a referida Lei n.º 142/85 como dotada de “valor refor- çado” – e entendendo que determinados procedimentos e condições por ela impostos, de forma geral e abstracta, à criação parlamentar de cada município em concreto – conferiu plena validade ao acto de instituição do município da Trofa, entendendo porém, que a “ilegalidade” decorrente da preterição de certas disposições da referida Lei Quadro, dotada (na óptica do Supremo) de valor paramétrico relativamente à lei que, em concreto, institui inova- toriamente certo município, envolveria responsabilidade civil com base no exercício ilegítimo da função legislativa – sendo, nessa perspectiva, julgada parcialmente procedente a acção indemnizatória movida pelo autor. O Supremo não rejeitou, deste modo, a validade e eficácia do acto legislativo de concreta instituição do mu- nicípio da Trofa (decorrente do artigo 1.º da Lei n.º 83/98 – e que, aliás, não integra o objecto do presente recurso).

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