TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

469 ACÓRDÃO N.º 133/10 de dois meios de prova independentes tendo por objecto a demonstração da existência ou inexistência do mesmo facto (“verificação cruzada”), exigem-se elementos que, embora não tendo por objecto o conteúdo da declaração probatória, consintam a verificação da sua veracidade ( elementi di riscontro ). Trata-se de adquirir por outro meio a prova de factos que, embora não coincidindo com aquele cuja demonstração está directa- mente em causa, permite deduzir que o sujeito que afirmou a realidade deste outro facto disse sobre ele a verdade. Nesta orientação, as declarações do co-arguido só podem fundamentar a prova de um facto crimi- nalmente relevante quando existe “alguma prova adicional a tornar provável que a história do co-arguido é verdadeira e que é razoavelmente seguro decidir com base nas suas declarações”, como se diz no acórdão recorrido. Não importa qualificar esta exigência acrescida para saber se ela significa um desvio (qualitativo) ao princípio da livre apreciação da prova ou se, afinal, não é senão a concretização de regras de experiência para a correcta realização da livre apreciação, em ordem a que esta se não apresente como arbítrio do julgador, antes consubstancie o resultado de uma actividade susceptível de se credenciar racionalmente perante o auditório de pessoas prudentes, experientes das coisas da vida e de recta intenção. Como também não é indispensável decidir se a existência de elementos de corroboração das declarações de um arguido desfavoráveis a outro, face às garantias constitucionais do processo penal, constitui complemento integrador sine qua non da sua atendibilidade. No caso, o entendimento normativo adoptado foi o de que “(…) a doutrina da corrobora- ção deve aqui desempenhar um papel, pois não estando o co-arguido sujeito a juramento, nem ao dever de verdade com cominação de sanção criminal, deve exigir-se alguma prova no sentido da comprovação das declarações do co-arguido”, pelo que é sobre ele que vai exercer-se o juízo de conformidade constitucional. 5. Como o Ministério Público põe em evidência, a jurisprudência do Tribunal a propósito de outras variantes do problema do conhecimento probatório do co-arguido conduz a uma resposta seguramente negativa à pretensão do recorrente. No Acórdão n.º 524/97, disponível, como os demais citados em www.tribunalconstitucional.pt , o Tribunal julgou inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 5, da Constituição da República, a norma extraída com referência aos artigos 133.º, 343.º e 345.º do Código de Processo Penal, no sentido em que confere valor de prova às declarações proferidas por um co-arguido, em prejuízo de outro co-arguido quando, a instâncias destoutro co-arguido, o primeiro se recusa a responder, no exercício do direito ao silêncio. Não se negou valor probatório às declarações do co-arguido. O que motivou o julgamento de inconstitucionalidade foi a violação do contraditório, não a falta ou deficiência de aptidão probatória de tais declarações. Apenas se afastaram em função do seu modo de produção, considerando-se contrário às garantias do arguido em processo penal que o arguido não possa contraditar toda a prova contra si produzida, como sucede quando o co-arguido se recusa a responder, no exercício do seu direito ao silêncio, às perguntas que a defesa do arguido prejudicado pelas suas declarações anteriores entende colocar-lhe. Note-se que a redacção do n.º 4 do artigo 345.º do Código, introduzido pela Lei n.º 48/2007, reflecte já este julgamento e foi este que foi aplicado ao caso. Embora essa não fosse a questão directamente colocada, está pressuposta na resposta dada no Acórdão n.º 524/97 a possibilidade de valoração das declarações do co-arguido, desde que respeitado o contraditório. Ora, a hipótese que no presente recurso se aprecia distancia-se daquela, precisamente, quanto ao aspecto que motivou o julgamento de inconstitucionalidade. Não integra a dimensão normativa em apreciação que o co-arguido que prestou as declarações desfavoráveis se tenha recusado a responder às perguntas formuladas pelo defensor do arguido prejudicado. Também do Acórdão n.º 304/04 só pode retirar-se argumento contrário à pretensão do recorrente. Neste Acórdão começa por reconhecer-se que a superação de um modelo inquisitorial do processo e a consagração basilar do processo penal de estrutura acusatória, tem subjacente a ideia da existência de limites intransponíveis à prossecução da verdade em processo penal. Limites que, no tocante à aquisição dos factos penalmente relevantes, se traduzem no conceito e regime das proibições de prova. Costa Andrade,

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