TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
467 ACÓRDÃO N.º 133/10 A invocação pelos recorrentes do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 524/97 – por lapso mencionam o n.º 525/97 – e do n.º 4 do artigo 345.º do CPP, aditado pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, situa-se já noutro plano: a das limitações a introduzir na prova feita por um co-arguido contra outro co-arguido. O Acórdão n.º 524/97, do Tribunal Constitucional, decidiu “julgar inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa, a norma extraída com referência aos artigos 133.º, 343.º e 345.º do Código de Processo Penal, no sentido em que confere valor de prova às declarações proferidas por um co-arguido em prejuízo de outro co-arguido quando, a instâncias destoutro co-arguido, o primeiro se recusa a responder, no exercício do direito ao silêncio”. O que estava ali em causa é o exercício do contraditório pelo co-arguido que se remeteu ao silêncio em relação àquele que pretendeu colaborar com o Tribunal. O n.º 4 do artigo 345.º do CPP, aditado pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, ao passar a estatuir que “não podem valer como meio de prova as declarações de um co-arguido em prejuízo de outro co-arguido quando o declarante se recusar a responder às perguntas formuladas nos termos dos n.ºs 1 e 2”, mais não consagrou que a jurisprudência do Acórdão n.º 524/97 do Tribunal Constitucional. Por fim, defendem os recorrentes que a admitir-se a valoração das declarações de um co-arguido contra o outro co-arguido esta seria uma forma indirecta a pressionar os co-arguidos que optaram pelo silêncio a responder a perguntas objecto do processo, o que é defeso pelo n.º 1 do artigo 126.º do Código de Processo Penal. Seria assim inconstitucional a interpretação que permita valorar as declarações de um co-arguido para efeitos de incriminação de outros co-arguidos que, no uso do direito previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 61.º do CPP, não prestem declarações sobre o objecto do processo. Cremos que também nesta parte não assiste razão aos recorrentes. Atento o disposto no artigo 61.º, n.º 1, alínea d) , do Código de Processo Penal, o arguido goza do direito de não responder a perguntas feitas, por qualquer entidade, sobre os factos que dele forem imputados e sobre o con- teúdo das declarações que acerca deles prestar. O direito ao silêncio – que não pode ser quebrado por qualquer das formas previstas no artigo 126.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, sob pena das provas assim obtidas serem nulas, não podendo ser utilizadas –, não pode repercutir-se na prova obtida e produzida através de meio legal, em termos de impedir a sua valoração quando demonstre a responsabilização criminal do arguido. Não só as declarações de co-arguido contra outro co-arguido, como qualquer outro meio de prova produzida em audiência de julgamento, colocam o co-arguido não declarante, que se remeteu ao silêncio, na situação de exercer ou não o contraditório. A produção da prova em audiência de julgamento, designadamente através de prestação de declarações de co-arguido contra outro co-arguido, não é uma forma indirecta a pressionar os co-arguidos que optaram pelo silêncio a responder a perguntas objecto do processo, mas sim a forma de realização de justiça própria de um Estado de direito democrático. Ainda no âmbito das limitações às declarações de co-arguido contra outro co-arguido, a doutrina e jurispru dência citadas estão de acordo em que a apreciação do valor probatório daquelas declarações exige especiais cautelas porquanto o declarante pode agir impulsionado por interesse em se desculpar mediante a incriminação do co-arguido se resta em silêncio ou por outro motivo. A doutrina citada e a jurisprudência maioritária exige que a sentença não alicerce os factos provados exclusivamente nas declarações de co-arguido contra outro co-arguido; é necessária uma corroboração probatória das declarações de co-arguido contra outro co-arguido. Já o citado acórdão do STJ de 12 de Março de 2008 defende que “dizer em abstracto e genericamente que o depoimento do co-arguido só é válido se for acompanhado de outro meio de prova é uma subversão das regras de produção de prova sem qualquer apoio na letra ou no espírito da lei”. Este Tribunal da Relação entende, tal como o tribunal a quo , que a doutrina da corroboração deve aqui desempenhar um papel, pois não estando o co-arguido sujeito a juramento, nem ao dever de verdade com comi- nação de sanção criminal, deve exigir-se alguma prova no sentido da comprovação das declarações do co-arguido.
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