TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

464 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: I — Relatório 1. A., condenado na pena de quatro anos de prisão, suspensa por igual período, pela prática de vários crimes (explosão, detenção de arma proibida, detenção ilegal de arma de fogo e detenção de munições proibidas), recorre do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 24 de Junho de 2009, que confirmou a decisão do tribunal de 1.ª instância, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC). Pretende que se aprecie a constitucionalidade da norma do n.º 4 do artigo 345.º, conjugado com os artigos 133.º, 126.º e 344.º do Código de Processo Penal (CPP), quando interpretados no sentido de permitir a valo- ração das declarações de um arguido em desfavor do co-arguido que, ao abrigo da alínea d) do n.º 1 do artigo 61.º do mesmo Código, entenda não prestar declarações sobre o objecto do processo. 2. Prosseguindo o processo para alegações, o recorrente conclui nos termos seguintes: «1) O artigo 32.º da Constituição da República consagra as garantias do processo criminal e o artigo 203.º da Lei Fundamental consagra a independência dos tribunais; 2) O n.º 1 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) consagra uma cláusula geral que aglutina e abrange todas as garantias de defesa, mormente as constantes do artigo 61.º do CPP; 3) O n.º 8 do artigo 32.º da CRP proíbe também a utilização de provas obtidas “mediante tortura, coacção, ofen- sa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações”; 4) O direito ao silêncio dos arguidos no que tange aos factos pelos quais estão acusados é um direito “fundamental” de todo e qualquer acusado que não pode ser afectado por qualquer forma; 5) Os arguidos e co-arguidos não podem depor como testemunhas no âmbito de um processo criminal [cfr. alínea a) do n.º 1 do artigo 133.º do CPP], reconhecendo assim a lei ordinária a inexistente credibilidade das referidas declarações; 6) O n.º 4 do artigo 345.º, conjuntamente com os artigos 133.º, 126.º e 344.º, todos do CPP, conjuntamente com os n. os l e 8 do artigo 32.º e artigo 203.º, ambos da CRP, impede a valoração das declarações de co-arguido quando as mesmas são objectivamente prejudiciais ao co-arguido que, no uso do direito que a Constituição e a lei garantem, se remeteu ao silêncio; 7) As instâncias valoraram as declarações do co-arguido B. em prejuízo do co-arguido A., que legalmente se remeteu ao silêncio; 8) É inconstitucional toda e qualquer interpretação que permita valorar as declarações de um co-arguido para efeitos de incriminação de outros co-arguidos que, no uso do direito previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 61.º do CPP e no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição, se recusem a prestar declarações sobre o objecto do processo. Inconstitucionalidade que expressamente se reitera e invoca para todos os legais e devidos efeitos. 9) A entender-se de forma contrária, estar-se-á a pressionar/coagir o arguido que se remeteu ao silêncio a falar sobre os factos pelos quais está acusado e esta situação não deixa de estar proibida pelo n.º 8 do artigo 32.º da CRP e pelo próprio artigo 126.º do CPP. Face ao exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente declarar-se inconstitu- cional a interpretação que as instâncias realizaram do n.º 4 do artigo 345.º, conjuntamente com os artigos 133.º, 126.º e 344.º, todos do CPP, na medida em que valoraram as declarações de um co-arguido em prejuízo do recor- rente que se remeteu ao silêncio, e consequentemente, ordenar-se a baixa do processo para prolação de nova decisão na qual não se valoram as referidas declarações.»

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