TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

457 ACÓRDÃO N.º 128/10 tos de interpretação jurídica, nomeadamente sistemáticos e históricos, que não os que se relacionem com o conteúdo semântico do ilícito. Não significa isto que tais elementos não são relevantes na interpretação de preceitos criminais. São-no, não só a propósito de formulações de iure condendo mas também enquanto auxiliares da tarefa prévia de averiguação do sentido normativo dos mesmos. Mas, em sede do princípio constitucional da tipicidade criminal, não podem ser apresentados como argumentos decisivos da asserção final que conclua pela violação, ou não, daquele princípio fundamental. 11.2. Assim, o que interessa apurar é se a expressão “quem agir voluntariamente como titular de um órgão” engloba, ou não, os casos dos administradores de facto. De modo a consagrar a punibilidade de tais administradores, a única obrigação que impende sobre o legislador é a de formular um preceito-tipo que contenha na sua previsão a actividade característica da administração de facto, não se encontrando o mesmo vinculado às construções dogmáticas de outros ramos do direito. 11.3. Semanticamente, a expressão “quem agir voluntariamente como titular de um órgão” apenas impõe a actuação (voluntária) em determinadas vestes ( i. e. como titular de um órgão). Não exige nem a detenção de título suficiente nem a validade de tal título. Como realça Germano Marques da Silva, “agir voluntariamente como órgão não é o mesmo que ser titular do órgão, mas exercer um poder correspondente ao do órgão e por essa via lesar o bem jurídico.” (cfr . ob. cit ., p. 319, itálico adicionado). Deste modo, a conduta típica apresenta-se apta a integrar, no seu elemento semântico, não só a conduta de quem age nas vestes de titular de um órgão como quem se apresenta nessa aparência, independentemente da inexistência de qualquer ligação funcional formal efectiva ou de eventuais vícios que rodeiam a mesma. O que o tipo exige, de modo a permitir uma imputação integrada nas fronteiras do princípio da tipicidade, é a actuação voluntária como ou enquanto titular do órgão. Esta previsão abrange assim os casos em que, como sucede nos autos, pelo exercício de facto das funções de administração societária é lesado o bem jurí­ dico tutelado. O preenchimento do tipo prescinde, deste modo, de uma qualquer formalização, ainda que incompleta ou irregular, da relação de administração ou gerência societária. 12. A averiguação da (in)constitucionalidade de interpretações normativas em face do princípio da legalidade criminal na vertente de tipicidade deve focar-se na determinação do alcance semântico do tipo criminal, verificando se a interpretação em causa ultrapassa, ou não, tais fronteiras. O que não se verifica no caso em apreço. Não se encontrando ultrapassada a “barreira semântica”, a interpretação normativa em causa cabe no leque de sentidos que é possível assacar ao preceito. Deste modo, resta concluir pela não verificação da violação princípio da legalidade criminal consagrado no artigo 29.º, n.º 1, da Constituição. III — Decisão 13. Nestes termos acordam, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional, negar provimento ao recurso. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta. Lisboa, 13 de Abril de 2010. – José Borges Soeiro – Gil Galvão (vencido quanto ao conhecimento do recurso, conforme declaração anexa) – Maria João Antunes (vencida nos termos da declaração de voto que se anexa) – Carlos Pamplona de Oliveira (vencido, nos termos da declaração que junto) – Rui Manuel Moura Ramos .

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