TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
410 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL n.º 247/2007 prevê ainda: «O pessoal de inspecção e os dirigentes dos serviços de inspecção tem direito a possuir e usar arma de todas as classes previstas na Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, com excepção da classe A, distribuídas pelo Estado, com dispensa da respectiva licença de uso e porte de arma, valendo como tal o respectivo cartão de identificação profissional». Perante este quando normativo, manifesto se afigura não poder esta polícia deixar de considerar-se incluída no conceito constitucional de «forças de segurança» constitucionalmente adoptado na alínea u) do artigo 164.º Competindo à ASAE, nos termos do artigo 3.º, alínea aa) , «desenvolver acções de natureza preventiva e repressiva em matéria de jogo ilícito», não se vê que outro entendimento pudesse propugnar-se. Neste exacto sentido se pronunciou, de resto, o recente e já acima aludido Acórdão do Tribunal Consti- tucional n.º 304/08, proferido em sede de fiscalização preventiva da constitucionalidade suscitada pelo Presi- dente da República referente à remissão para portaria em matéria de fixação das competências das diversas unidades da Polícia Judiciária (PJ), nos termos do n.º 2 do artigo 22.º do Decreto n.º 204/X, da Assembleia da República. Com efeito, pode ler-se na fundamentação daquele Acórdão: « (…) competindo àPJ, nos termos do artigo4.º doDecreto sob análise, alémdomais, uma actividade de prevenção e detecção criminal, nãopode esta polícia deixar de estar incluída no conceito constitucional de “forças de segurança” ( vide, neste sentido, Pedro Lomba , em “Sobre a teoria das medidas de polícia administrativa” , em Estudos de direito de polícia, 1.º volume, pp. 191-192, edição de 2003, da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, João Raposo, em Direito policial I, pp. 43 e 49, da edição de 2006, da Almedina, e Guedes Valente, em Teoria geral do direito policial, p. 18, da edição de 2005, da Almedina), independentemente das discussões que suscite uma qualificação conceptual apurada deste tipo de polícia (vide um relato desta polémica na doutrina nacional e estrangeira em A questão das polí cias municipais , de Catarina Sarmento e Castro, pp. 97-104, da edição de 2003, da Coimbra Editora)». Hoje «ninguém duvida que a “criação, definição de tarefas e direcção orgânica” das forças de segurança é matéria de lei», como resulta ainda sublinhado na declaração de voto expressa pelo Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro. De resto, o alcance da referida alínea u) do artigo 164.º da CRP, já fora objecto de análise pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 23/02, em sede de fiscalização preventiva da Lei Orgânica da Guarda Nacional Republicana. Também ali se concluiu estarem incluídas na referida alínea «as regras definidoras daquilo que é comum e geral às forças de segurança, as grandes linhas da regulação, a definição dos serviços, organizações ou forças que devem compor as forças de segurança, finalidades e os princípios básicos fundamentais relativos, verbi gratia , à definição do seu sistema global, complexo de poderes, funções, competências e atribuições de cada serviço, força ou organização, inter-relacionação, projecção funcional interna e externa e, ainda, os princípios básicos rela- tivos à interferência das forças de segurança com os direitos fundamentais dos cidadãos » . Perante este quadro de exigência constitucional, manifesto se afigura que a alínea aa) do artigo 3.º Decreto-Lei n.º 274/2007, ao atribuir à ASAE a competência para desenvolver acções de natureza preventiva e repressiva em matéria de jogo ilícito, enferma de inconstitucionalidade orgânica, por violação de reserva de lei da Assembleia da República. Mas ainda por um outro prisma se afigura ser desconforme à CRP a referida atribuição de competência à ASAE prevenir e reprimir o jogo ilícito: a reserva de lei para as medidas de polícia estabelecida no artigo 272.º, n.º 2, da CRP. Dispõe, com efeito, a referida norma constitucional: “as medidas de polícia são as pre- vistas na lei, não devendo ser utilizadas para além do estritamente necessário”. Trata-se de mais um sinal inequívoco de cautela constitucional expressada diante a séria possibilidade da actividade policial interferir de forma especialmente intensa no âmbito dos direitos, liberdades e garantias fundamentais, visando a exigência de tipificação legal limitar, tanto quanto possível, o espaço de discriciona- riedade na actuação policial em áreas que colidam com os direitos dos cidadãos. Em sede de direitos fundamentais, a polícia só pode, portanto, agir dentro dos limites autorizados pela lei. Ora, desta exigência constitucional contida no artigo 272.º, n.º 2, da CRP decorre também a necessidade de definição na lei quais as medidas restritivas de direitos que uma força policial pode utilizar.
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