TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
403 ACÓRDÃO N.º 83/10 3. O recurso foi admitido. Já no Tribunal Constitucional a partes foram convidadas a alegar. O Ministério Público recorrente concluiu da seguinte forma a sua alegação: 1.º A norma constante no n.º 3 do artigo 39.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março – conjugada com o preceituado no artigo 324.º, alínea a) , da Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, que regulamentou o artigo 380.º do Código do Trabalho– enquanto impõe ao trabalhador que pretenda instaurar novo processo de insolvência (num caso em que o anteriormente pendente terminou com a prolação de sentença “simplificada”), para nele ver reconhecido o seu direito ao pagamento de créditos laborais, a efectivar contra o Fundo de Garantia Salarial, o ónus de depositar ou garantir o montante fixado pelo juiz, como condição do direito de acção, mesmo nos casos de comprovada insuficiência económica –, colide com o direito fundamental de acesso à justiça e aos tribunais, afirmado pelo artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa. 2.º Pelo que, deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade formulado pela decisão recorrida. Por seu turno, as recorridas B. e C. concluíram: A) As ora recorridas, para poderem beneficiar da garantia que o referido Fundo proporciona, necessitavam que, no processo de insolvência, os seus créditos possam ser reclamados [vide artigo 380.º do Código do Trabalho e 324.º, alínea a) , da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho]. B) E tendo a declarada insolvência sido qualificada com carácter limitado, as recorridas tinham interesse em requerer a complementação da sentença com as restantes menções do artigo 36.º do CIRE, designada- mente a fase de reclamação de créditos. C) Tendo as ora recorridas requerido junto da Segurança Social, a concessão de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça inicial e demais encargos com o processo, requereram a dispensa de depósito e do caucionamento aludidos no n.º 3 do artigo 39.º do CIRE, por insuficiência económica. D) A norma constante do artigo mencionado na alínea anterior violaria o princípio constitucional do acesso ao direito consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da CRP enquanto impõe às recorridas o ónus de depositar ou garantir o montante fixado pelo juiz como condição do seu direito de acção. E) Sendo que o único objectivo das recorridas com o complemento da sentença foi a obtenção de documento comprovativo dos créditos reclamados, o qual se mostra necessário para instruir o requerimento junto do Fundo de Garantia Salarial. F) Pelo que deve confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade formulado pela decisão recorrida. Nestes termos, e nos demais de direito que V. Ex. as mui doutamente suprirão, deve o presente recurso ser procedente e ser confirmada a decisão recorrida, com o que se fará a mais lídima Justiça! 4. Em causa está, portanto, a norma constante do n.º 3 do artigo 39.º do CIRE, quando interpreta- da no sentido de que o requerente do complemento da sentença, quando careça de meios económicos e, designadamente, beneficiar do apoio judiciário na modalidade de isenção de taxa de justiça e demais encar- gos com o processo, se não depositar a quantia que o juiz especificar nem prestar a garantia bancária alterna- tiva, não pode requerer aquele complemento da sentença, norma que, no entender da decisão recorrida, viola a garantia do acesso ao direito consagrado no citado artigo 20.º, n.º 1, da Constituição. Na opinião do Ministério Público aqui recorrente, essa norma, enquanto impõe – mesmo nos casos de comprovada insuficiência económica – ao trabalhador que pretenda instaurar novo processo de insolvência para nele ver reconhecido o seu direito ao pagamento de créditos laborais o ónus de depositar ou garantir o montante fixado pelo juiz como condição do direito de acção colide com o direito fundamental de acesso à justiça e aos tribunais, afirmado pelo artigo 20.º, n.º 1, da Constituição. Também as recorridas B. e C. afirmam o mesmo entendimento, pelo que a sentença deveria ser confir- mada neste ponto.
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