TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
346 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 2.2. O Decreto‑Lei n.º 119/99, editado em desenvolvimento do regime jurídico estabelecido na Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto, após regular substantivamente as medidas de reparação do desemprego, designa- damente de natureza prestacional e respectivas condições de atribuição, montantes e duração, insere, no plano procedimental ou adjectivo, regras relativas ao processamento e gestão de tais prestações, resultando do artigo 61.º, n.º 1, na interpretação desaplicada pela decisão recorrida, a fixação de um prazo de caducidade da “totalidade das prestações” que integram o subsídio de desemprego se o interessado não requerer a sua atribuição nos “90 dias consecutivos a contar da data do desemprego”. O subsequente artigo 63.º prevê diversas situações de suspensão deste prazo, entre elas a de incapacidade por doença [alínea a) do n.º 1], mas, quanto a esta causa de suspensão, o n.º 3 do preceito exige que, quando a inca- pacidade se prolongue por mais de 30 dias, seguidos ou interpolados, só determina a suspensão “se confirmada pelo sistema de verificação de incapacidades, após comunicação do facto pelo interessado”. No presente caso, embora a requerente tenha invocado uma situação de doença, susceptível de funcionar como “justo impedimento” da tempestiva formulação do requerimento, apresentando atestado médico (cfr. p. 14 do processo administrativo anexo), não cumpriu o ónus de provocar a “confirmação” de tal incapacidade pelo “sistema de verificação” insti- tuído e, por isso, não foi considerada qualquer suspensão do aludido prazo de 90 dias. Como resulta da decisão recorrida, não se questiona a constitucionalidade da exigência de formulação pelo próprio interessado de pedido de concessão de subsídio de desemprego, nem sequer do estabelecimento de um prazo para tal formulação. O que está em causa – como se salienta nas alegações do Ministério Público, convocando o “princípio da pro- porcionalidade” – não é, porém, o estabelecimento de tal prazo, ou mesmo a sua normal suficiência para a dedução do pedido pelo trabalhador em situação de desemprego involuntário, mas antes a razoabilidade das consequências associadas ao incumprimento desse prazo. É que importa distinguir o “direito global ou complexo” às prestações emergentes da verificação de uma situação de desemprego relevante, podendo o período de concessão do subsídio de desemprego alcançar, nos termos do artigo 31.º, n.º 2, do Decreto‑Lei n.º 119/99, 30 meses (ainda susceptíveis dos acréscimos previstos no subsequente n.º 3) para os beneficiários com idade igual ou superior a 45 anos de idade (como era o caso da requerente, nascida em 14 de Setembro de 1948 – cfr. p. 1 do processo administrativo anexo); e o “direito a cada uma das prestações” parcelares que sucessivamente se vão vencendo, a partir da data do requerimento. Nem a decisão recorrida nem o recorrente questionam que o retardamento injustificado na apresentação do requerimento pelo interessado – iniciando ou impulsionando o procedimento de verificação pela Segurança Social dos pressupostos ou condições da atribuição das prestações – possa fazer caducar ou precludir as “prestações par- celares” que entretanto se poderiam ter vencido. O que se reputa inconstitucional, por desproporcionado, é o entendimento segundo o qual qualquer atraso no cumprimento do referido prazo peremptório de 90 dias dita a irremediável caducidade do “direito global” a todas as prestações. Como refere o recorrente, não se vê que as razões de segurança jurídica, subjacentes ao estabelecimento de prazos de caducidade, sejam suficientes para – com base em qualquer “mora” do trabalhador desempregado – o privar, “na totalidade”, da percepção de todas as prestações pecuniárias substitutivas das remunerações salariais perdidas du- rante o período em que lhe deveriam ser concedidas, perdurando a situação de desemprego involuntário: a circun- stância de a autora ter formulado a sua pretensão perante a Segurança Social apenas em 19 de Novembro de 2002 (quando o deveria ter feito até 9 de Agosto de 2002) não é susceptível de dificultar, de modo relevante, a actividade procedimental cometida à Segurança Social no âmbito do procedimento em causa, destinada essencialmente a ajuizar da existência dos pressupostos e condições do direito às prestações de desemprego e calcular a respectiva duração e montante – sendo certo que tal “mora” dos trabalhadores sempre ditará a preclusão ou caducidade das prestações parcelares que se teriam vencido até à referida data de apresentação do requerimento. A estas considerações – que se sufragam – apenas se aditará que, tendo o subsídio de desemprego uma função sucedânea da remuneração salarial de que o trabalhador se viu privado e sendo a situação de desemprego, geradora do direito àquele subsídio, por natureza uma situação permanente e não instantânea, que se prolonga e renova no tempo, é de todo desrazoável fulminar com a perda definitiva e irreversível do direito ao subsídio de desemprego,
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