TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

345 ACÓRDÃO N.º 49/10 1 – A atribuição das prestações de desemprego deve ver requerido no prazo de 90 dias consecutivos a contar da data do desemprego e ser precedida de inscrição para emprego no centro de emprego. Através do Acórdão n.º 275/07, o Tribunal Constitucional pronunciou-se já sobre a norma correspon- dente a esta, constante do artigo 61.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 119/99, de 14 de Abril, diploma que anteriormente regulava a mesma matéria, vindo a concluir pela sua inconstitucionalidade, por violação do princípio da proporcionalidade conjugado com o artigo 59.º, n.º 1, alínea e) , da Constituição da República (CRP), quando interpretada no sentido de que o incumprimento do prazo de 90 dias aí mencionado impli- cava a irremediável preclusão do direito global a todas as prestações a que o interessado teria direito durante todo o período de desemprego involuntário. É a seguinte a sua fundamentação. 2.1. Em termos constitucionais, a situação de desemprego não é apenas uma daquelas “situações de falta ou diminuição de meios de subsistência” em que incumbe ao “sistema de segurança social” a protecção dos “cidadãos” (artigo 63.º, n.º 3, da CRP, inserido no capítulo dedicado aos direitos e deveres sociais). Especificamente quanto aos trabalhadores que “involuntariamente se encontrem em situação de desemprego”, o artigo 59.º, n.º 1, alínea e) , da CRP (inserido no capítulo dedicado aos direitos e deveres económicos) confere expressa e directamente a esses trabalhadores o direito a “assistência material”. O direito a assistência material nas situações de desemprego involuntário constitui, assim, um direito fun- damental dos trabalhadores, com amplo âmbito de aplicação (abrangendo os trabalhadores da Adminis­ tração Pública, como se decidiu no Acórdão n.º 474/02, e os trabalhadores independentes), embora a sua plena concretização dependa das disponibilidades financeiras e materiais do Estado (Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , tomo I, Coimbra, 2005, pp. 609‑610). Para J. J. Gomes Cano- tilho e Vital Moreira ( Constituição da República Portuguesa Anotada , 4.ª edição, Vol. I, Coimbra, 2007, p. 774), o direito ao subsídio de desemprego consiste numa espécie de compensação ou indemnização por não sat- isfação do direito ao trabalho (proclamado no artigo 58.º, n.º 1), pelo que, nesta perspectiva, ele deveria satisfazer os seguintes requisitos: (a) ser universal, abrangendo todos os desempregados, independentemente de já terem tido um emprego ou não; (b) manter‑se enquanto persistir a situação de desemprego, não podendo, portanto, ter um limite temporal definido; (c) permitir ao desempregado uma existência condigna, não podendo portanto ficar muito aquém do salário mínimo garantido. Reconhecendo embora que a realização deste direito prestacional, de natureza positiva, depende do legislador e da sua implementação administrativa e financeira, entendem os referidos autores que o regime legal actual (Decreto‑Lei n.º 119/99) não dá resposta aos apontados requisitos. No citado Acórdão n.º 474/02, em que se deu por verificado o não cumprimento da Constituição, por omissão das medidas legislativas necessárias para tornar exequível o direito previsto na alínea e) do n.º 1 do seu artigo 59.º, relativamente a trabalhadores da Administração Pública, o Tribunal Constitucional entendeu não ser relevante, para a tarefa então em causa (apuramento de uma situação de inconstitucionalidade por omissão), a adopção de uma posição expressa quanto à qualificação – sustentada pelo requerente (Provedor de Justiça) – do direito à assis­ tência material em situação involuntária de desemprego como um direito de natureza análoga à dos denominados direitos, liberdades e garantias, pois para a ocorrência de uma situação de inconstitucionalidade por omissão basta que o legislador não tenha executado, ou tenha executado apenas parcialmente, uma imposição constitucional con­ creta, mesmo que o direito em causa seja um direito social e não deva ser tido como análogo aos direitos, liberdades e garantias. Seja como for, a inegável “fundamentalidade” do direito dos trabalhadores à assistência material em situação de desemprego involuntário implica – obviamente sem questionar a liberdade de conformação do legislador na concretização material desse direito – que a regulação do correspondente procedimento administrativo fique subor- dinada ao “princípio da proporcionalidade”, no sentido de que as exigências procedimentais devem ser necessárias e adequadas e de que as consequências do seu incumprimento devem ser razoáveis.

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