TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

328 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Trata-se assim de um princípio que exprime a realização imperativa de uma especial exigência de pre- visibilidade, protegendo sujeitos cujas posições jurídicas sejam objectivamente lesadas por determinados quadros injustificados de instabilidade (Blanco de Morais, “ Segurança Jurídica e Justiça Constitucional”, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa , Vol. XLI, n.º 2, 2000, p. 625). Explicitando um pouco mais esta ideia, assim se escreveu no Acórdão n.º 786/96 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional , 34.º Vol., pp. 23 e segs.): «O princípio da protecção da confiança exprime uma ideia de justiça que aprofunda o Estado de direito democrático. Segundo ela, o Estado não pode legislar alterando as expectativas legítimas dos cidadãos relativa- mente às respectivas posições jurídicas, a não ser que razões ponderosas o ditem (…). Prevalecem, neste último caso, a necessidade e o valor dos fins almejados, perante a segurança e a solidez das expectativas. Mas tal sacrifício das expectativas deve ser previsível para os cidadãos atingidos e não desproporcional à lesão dos interesses subja- centes (…).» Mas haverá lesão de expectativas que implique a violação do princípio da confiança? Pressuposto de tal violação é a validade das expectativas. Isso não implica, necessariamente, que estas correspondam a direitos subjectivos, mas apenas que tenham um fundamento jurídico. E, por outro lado, não bastam quaisquer expectativas tuteladas juridicamente para que se justifique a intervenção do princípio da confiança. A validade das expectativas impõe que a previsibilidade da manutenção de uma posição jurídica se fundamente em valores reconhecidos no sistema e não apenas na inércia ou na manutenção do status quo. O ponto é que, no caso em apreço, não pode dizer-se que a recorrente não pudesse razoavelmente contar com a interpretação normativa que foi seguida pelo tribunal recorrido. Essa interpretação corresponde a um entendimento jurisprudencial corrente e, como se observou já, não envolve, em si, uma qualquer violação do direito de acesso aos tribunais. Por outro lado, a recorrente não pode declarar-se surpreendida com a alteração do valor da causa – e o consequente agravamento do montante das custas –, quando foi notificada do despacho que fixou esse valor, e teve intervenção no processo a seguir à prolação desse despacho, e teve necessariamente de ponderar o montante das custas que ficaria a seu cargo, ao acordar na resolução do litígio por transacção judicial, que, além do mais, implicava a aceitação da responsabilidade pelo pagamento das custas que fossem apuradas no processo. Não pode ignorar-se, por outro lado, que o valor da causa indicado na petição inicial estava em mani- festa contradição com o regime legal aplicável, pelo que sempre seria previsível que esse valor fosse corrigido por intervenção oficiosa do juiz, nos termos legalmente admitidos. Assim sendo, a recorrente não pode invocar uma expectativa legítima quanto ao montante das custas a liquidar, quando é certo que, usando da diligência processual devida, poderia ter obtido todas as informações relativas ao desenvolvimento e estado da causa, incluindo no se refere à falada alteração do valor inicial da acção, que, de resto, eram relevantes para efeito de transigir sobre os direitos que constituíam objecto do pedido, e podia até ter previsto a possível correcção do valor da causa por efeito da intervenção oficiosa do juiz. Além de que, estando definido o princípio segundo o qual, «no caso de transacção, as custas são pagas a meio, salvo acordo em contrário» (artigo 451.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), a recorrente não poderia aceitar, segundo a normalidade das coisas, um agravamento da sua posição processual em relação ao critério legalmente estabelecido sem previamente providenciar no sentido de determinar com precisão qual o valor total das custas que, por via do acordo, ficavam a seu cargo. Tudo indica, por conseguinte, não haver, no caso, violação dos princípios da segurança jurídica e da justiça material. 5. A recorrente invoca, no entanto, ainda a violação do princípio da igualdade, por considerar que a interpretação adoptada poderá implicar uma inadmissível distinção entre os casos em que a situação de insu­ ficiência económica é superveniente ou decorre, no decurso de processo, de um encargo excepcional, dos

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