TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

325 ACÓRDÃO N.º 46/10 3. Como decorre da matéria de facto descrita, a recorrente requereu o benefício de apoio judiciário já após o trânsito em julgado da decisão final, e na sequência de um incidente de reforma da conta, que deter- minou a rectificação do montante das custas a pagar de € 467,86 para € 106 337,69. A correcção ficou, por outro lado, a dever-se à alteração do valor da causa, determinada pelo juiz no decurso do processo e antes da prolação da decisão final, ao abrigo do disposto no artigo 315.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que permite que o valor da causa acordado, expressa ou tacitamente, pelas partes possa ser alterado pelo tribunal quando se encontre em flagrante oposição com a realidade. A acção visava a declaração de nulidade do contrato de compra e venda de um imóvel, pelo que não lhe correspondia o valor equivalente à alçada da Relação mais Esc.: 1$, previsto no artigo 312.º do Código de Processo Civil, e que se refere às acções sobre o estado das pessoas ou sobre interesses imateriais, como foi indicado na petição inicial, mas antes o valor do acto jurídico cuja validade se pretendia apreciar, como determina o artigo 310.º do mesmo diploma. Pretende a recorrente que a interpretação feita pelo tribunal recorrido das normas dos artigos 1.º, 6.º, n.º 2, 18.º, 29.º, n.º 5, 44.º, n.º 1, e 51.º, n.º 3, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, no sentido de que o apoio judiciário apenas permite dispensar do pagamento de encargos com o processo originados após a sua concessão, é inconstitucional por afrontar os princípios da segurança jurídica, da justiça material, do acesso ao direito e igualdade, consagrados nos artigos 2.º, 13.º e 20.º da Lei Fundamental. É esta a questão que interessa dilucidar. A Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, que altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais, entrou em vigor em 1 de Setembro de 2004 e, segundo o regime transitório decorrente do seu artigo 51.º, apenas se tornou aplicável aos pedidos de apoio judiciário que fossem formulados após essa data (n.º 1), permitindo, no entanto, o n.º 3 que nos processos judiciais pendentes em 1 de Setembro de 2004 em que ainda não tenha sido requerido o benefício de apoio judiciário, este possa ser requerido até ao trânsito em julgado da decisão final. No caso vertente, o processo terminou com transacção entre as partes que foi homologada por despacho judicial entretanto transitado em julgado, e o apoio judiciário foi requerido pelo ora recorrente em 17 de Maio de 2005 no âmbito de um incidente de reforma de conta que foi suscitado em 11 de Março de 2004. Tendo já transitado em julgado, à data de início de vigência da Lei n.º 34/2004, a decisão final do pleito, nada obstava, em todo o caso, a que o pedido de apoio judiciário fosse requerido para os termos do incidente pós-decisório, justificando-se a sujeição do pedido ao novo regime de acesso ao direito estabelecido por esse diploma, não por força do n.º 3 do artigo 51.º, que não tinha aplicação ao caso, mas por via do princípio geral definido no n.º 1 desse artigo, pelo qual o novo regime é aplicável aos pedidos de apoio judiciário formulados após 1 de Setembro de 2004. A decisão a proferir sobre o pedido não podia, no entanto, ser influenciada pelas alterações entretanto introduzidas pela Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto, que apenas se aplicavam aos pedidos de protecção jurídica apresentados após a entrada em vigor dessa lei, que ocorreu em 1 de Janeiro de 2008 (artigos 6.º e 8.º). No tocante à oportunidade do pedido de apoio judiciário, vigorava, por conseguinte, a norma do artigo 18.º da Lei n.º 34/2004, na sua redacção originária, que, na parte que mais releva, dispunha nos seguintes termos: 1 – O apoio judiciário é concedido independentemente da posição processual que o requerente ocupe na causa e do facto de ter sido já concedido à parte contrária. 2 – O apoio judiciário deve ser requerido antes da primeira intervenção processual, salvo se a situação de insu- ficiência económica for superveniente ou se, em virtude do decurso do processo, ocorrer um encargo excepcional, suspendendo-se, nestes casos, o prazo para pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo até à decisão definitiva do pedido de apoio judiciário, aplicando-se o disposto nos n . os 4 e 5 do artigo 24.º 3 – Nos casos referidos no número anterior, o apoio judiciário deve ser requerido antes da primeira interven- ção processual que ocorra após o conhecimento da respectiva situação. […]

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=