TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
318 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de 1988, e I Série, de, respectivamente, 3 de Março de 1988 e 28 de Abril de 1994, e ainda Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1993, pp. 127 e segs; Jorge Miranda, «O regime dos direitos, liberdades e garantias», in Estudos sobre a Constituição , vol. III, pp. 50 e segs., e Manual de Direito Cons titucional, tomo IV, Coimbra, 1993, p. 219; Maria da Glória Ferreira Pinto, «Princípio da Igualdade — Fórmula Vazia ou Fórmula Consagrada de Sentido?», in Separata do Boletim do Ministério da Justiça, n.º 358, Lisboa, 1987; Lívio Paladin, Il Princípio costituzionale d’equaglianza, Milão, 1965).» E, assim, aos tribunais, na apreciação daquele princípio, não compete «substituírem-se» ao legislador, ponderando a situação como se estivessem no lugar dele e impondo a sua própria ideia do que seria, no caso, a solução «razoável», «justa» e «oportuna» (do que seria a solução ideal do caso); compete-lhes, sim «afastar aquelas soluções legais de todo o ponto insusceptíveis de se credenciarem racionalmente» (acórdão da Comissão Constitucional, n.º 458, Apêndice ao Diário da República, de 23 de Agosto de 1983, pp. 120, também citado no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 750/95, que vimos acompanhando). À luz das considerações precedentes pode dizer-se que a caracterização de uma medida legislativa como inconstitucional, por ofensiva do princípio da igualdade dependerá, em última análise, da ausência de fun- damento material suficiente, isto é, de falta de razoabilidade e consonância com o sistema jurídico (nestes precisos termos o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 370/07). Tem de reconhecer-se que, em hipóteses como a dos autos, não é inteiramente satisfatório a explicação acima apontada para a exclusão: ser o condutor uma das pessoas cuja responsabilidade está segura. Efectiva- mente, os tribunais da causa decidiram que o acidente não ocorreu por culpa do condutor lesado e, assim, tendo a situação sido qualificada como de responsabilidade objectiva do dono do veículo, por conta de quem este era conduzido, não pode retirar-se argumento do facto de o condutor ter a sua responsabilidade garan- tida nos termos do artigo 8.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 522/85. Mas, tal circunstância não impede que se encontre um mínimo de justificação capaz de suportar o tratamento diferenciado do condutor relativamente aos demais passageiros ou ocupantes do veículo, mesmo em situações deste tipo de responsabilidade pelo risco. Note-se que é aqui muito lata a discricionariedade do legislador. Na verdade, não pode dizer-se que ao instituir o seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel o legislador esteja a concretizar uma medida constitucionalmente imposta. O seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel é um meio de colectivização ou socialização do risco da circulação rodoviária, em último termo suportado pelos prémios pagos pelos tomadores (obrigatórios) desse seguro, cuja extensão não é constitucionalmente determinada. O legislador adopta uma política em que, em contra- ponto à protecção dos lesados por acidentes de viação, pode ponderar outros interesses ou finalidades con- correntes, como os custos acrescidos do alargamento da cobertura e, até, avaliar as desvantagens, na política de prevenção de segurança rodoviária, de uma sobreprotecção do condutor. Ora, não está em causa o ressarcimento dos danos sofridos pelo condutor a cargo de quem possa ser responsabilizado a título de culpa ou de responsabilidade pelo risco, mas a extensão ou reforço de protecção do lesado em que consiste o seguro obrigatório. Tenha ou não ficado provado que o acidente se deveu a culpa sua, o condutor do veículo causador do acidente ao desempenhar essa actividade da condução aceita o risco que ela envolve em termos diferenciados das dos demais ocupantes do veículo. Poder-se-á objectar que tal risco, enquanto englobado no risco inerente à circulação do veículo, é do comitente por conta e direcção de quem o lesado conduz o veículo, mas tal situação e o correspondente direito à indemnização está acautelado nas normas que regulam a responsabilidade pelo risco do dono do veículo, como se decidiu nos autos. E não pode ignorar-se que, naquilo que se designa por responsabilidade pelo risco e que nos acidentes rodoviários, nas explicações dogmáticas correntes, se imputa a riscos próprios do veículo, vem a cair, em termos práticos, todas as situações em que se não prova a culpa do condutor. Na imensa generalidade dos casos, na génese dos acidentes com veículos automóveis encontra-se uma multiplicidade de decisões e actuações dos condutores que, mesmo quando não fica provada a culpa, concorrem para potenciar ou não minorar os riscos próprios dos veículos. Os riscos próprios do veículo não são tanto riscos da máquina em si mesma como do modo
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