TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
317 ACÓRDÃO N.º 25/10 Independentemente de saber se uma norma excludente da indemnização pela lesão dos respectivos bens jurídicos pode considerar-se, em abstracto, idónea a violar tais princípios – tal norma não autoriza a atentar contra a vida ou a integridade física e moral das pessoas –, o certo é que o acórdão recorrido não entendeu que os danos corporais sofridos pelo condutor em consequência de acidente de viação não eram passíveis de ser indemnizados. O que é legítimo concluir deste aresto é que o condutor do veículo sinistrado tem direito a ser indemnizado pelos danos sofridos nos termos das normas gerais da responsabilidade civil (cfr. artigo 483.º e segs. do Código Civil), mas que, no caso, esse direito não está abrangido no âmbito do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel regulado no Decreto-Lei n.º 522/85. A circunstância de resultar da decisão a não atribuição da indemnização ao condutor do veículo sinistrado pelos danos corpo- rais sofridos no acidente não decorre unicamente desta exclusão, mas também do facto de o recorrente ter deixado prescrever o direito de accionar o responsável civil por tal indemnização – a entidade proprietária do veículo e por conta de quem este era conduzido – não constituindo as normas que fundamentaram a decisão quanto à matéria da prescrição objecto do recurso de constitucionalidade. Quanto à norma do artigo 20.º, n.º 4, o que o recorrente poderá querer questionar será o direito a um processo equitativo, o que – tal como se sublinhou no Acórdão n.º 1193/96 – exige não apenas um juiz independente e imparcial (um juiz que, ao dizer o direito do caso, o faça mantendo-se alheio, e acima, de influências exteriores, a nada mais obedecendo do que à lei e aos ditames da sua consciência), como também que as partes sejam colocadas em perfeita paridade de condições, por forma a desfrutarem de idênticas pos- sibilidades de obter justiça, pois, criando-se uma situação de indefesa, a sentença só por acaso será justa . Porém, não se vislumbra em que medida a interpretação normativa em causa interfere com o direito ao processo equitativo, nem o recorrente o explicita. A eventual “injustiça” do resultado da acção de que emerge o presente recurso foi produto, também, da verificação da prescrição e não apenas da interpretação normativa impugnada em sede de recurso de constitucionalidade, como se sublinhou. E, de todo o modo, a interpreta- ção normativa adoptada, conducente à exclusão do direito de indemnização, não se reconduz a uma situação de indefesa consubstanciadora do vício de violação deste preceito constitucional. É uma norma que dispõe sobre a relação jurídica material, sobre o conteúdo do direito, não sobre as condições e os termos processuais para vê-lo reconhecido pelos tribunais 12. Invoca também o recorrente que a interpretação dada à norma do artigo 7.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 522/85, no sentido de excluir da garantia do seguro obrigatório os danos decorrentes de lesões corporais sofridos pelo condutor do veículo, viola o princípio da igualdade, pelo que importa averiguar se essa exclusão da obrigação de segurar poderá ser entendida como medida razoável, racional ou objectivamente fundada. Como logo se salientou no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 750/95 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt , como os demais citados sem referência a local de publicação): «O princípio da igualdade reconduz-se […] a uma “proibição de arbítrio” sendo inadmissíveis quer a diferen- ciação de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objectivos, constitucio- nalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais. A proibição de arbítrio constitui um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controle. Mas existe, sem dúvida, violação do princípio da igualdade enquanto proibição de arbítrio, quando os limites externos da discricionariedade legislativa são afrontados por ausência de “adequado suporte material” para a medi da legislativa adoptada. Por outro lado, as medidas de diferenciação hão-de ser materialmente fundadas sob o ponto de vista da segu rança jurídica, da praticabilidade, da justiça e da solidariedade, não devendo basear-se em qualquer razão cons titucionalmente imprópria (cfr. sobre a matéria, por todos, os Acórdãos do Tribunal Constitucional n. os 44/84, 425/87, 39/88 e 231/94, in Diário da República, II Série, de, respectivamente, 11 de Junho de 1984 e 5 de Janeiro
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