TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
314 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL pessoais ou patrimoniais a terceiros, ao estabelecer a obrigação de cobrir a responsabilidade civil emergente da circulação de veículos, não deixando a sua sorte ao acaso da previdência dos responsáveis, o legislador protege de modo genérico as potenciais vítimas e futuros titulares do direito à reparação. 8. O regime jurídico do seguro obrigatório automóvel encontra-se amplamente penetrado por normas de direito da União Europeia sobre as quais o Tribunal de Justiça se tem debruçado e que se reflectem não apenas no domínio do seguro como também nos direitos nacionais em matéria de responsabilidade civil. Como nos dá conta Moitinho de Almeida «Seguro Obrigatório Automóvel: O direito português face à jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades» in Revista do Centro de Estudos Judiciários, 2.º Semes- tre 2007, n.º 7, pp. 55 e segs.), foram publicadas cinco directivas no domínio do seguro obrigatório automóvel que, por um lado, visam assegurar a livre circulação dos veículos com estacionamento habitual no território da União Europeia bem como das pessoas neles transportadas, e, por outro, garantir que as vítimas de acidentes causados por esses veículos beneficiem de tratamento comparável, seja qual for o local em que o acidente ocorra [É assim que o Tribunal de Justiça resume o objectivo das directivas em causa: acórdãos de 28 de Março de 1996, Ruiz Bernáldez, C-129/94, Colectânea p. I-1831, n.° 13; de 14 de Setembro de 2000, Mendes Ferreira e Delgado Correia Ferreira, C-348/98, Colectânea p. I-6711, n.° 24; e de 30 de Junho de 2005, Katja Candolin, C-537/03, Colectânea p. I- 5745 , n.° 17]. Trata-se das directivas 72/166/CEE, de 24 de Abril (1.ª Directiva), 84/5/CEE, de 30 de Dezembro de 1983 (2.ª Directiva), 90/232/CEE, de 14 de Maio de 1990 (3.ª Directiva), 2000/26/CE, de 16 de Maio de 2000 (4.ª Directiva) e 2005/14/CE, de 11 de Maio (5.ª Directiva) [publicadas, respectivamente no Jornal Oficial (1972) L 103, p. 1; (1984) L 8, p. 17; (1990) L 129 p. 33; (2000) L 181, p. 65; e (2000) L 149, p. 14]. Com particular interesse para o caso em apreço interessa considerar o teor da 3.ª Directiva que – con- siderando a existência em certos Estados-membros de lacunas na cobertura pelo seguro obrigatório dos passageiros de veículos automóveis e que, para proteger essa categoria particularmente vulnerável de vítimas potenciais, é conveniente que essas lacunas sejam preenchidas, no seguimento das duas anteriores directivas em matéria de responsabilidade civil automóvel, de modo uniforme (cfr. parágrafos 5.º e 12.º do preâmbulo da Directiva) –, estabelece no seu artigo 1.º o seguinte: “Article 1 – Without prejudice to the second subparagraph of Article 2 of Directive 84/5/EEC, the insurance referred to in Article 3 of Directive 72/166/EEC shall cover liability for personal injuries to all passengers, other than the driver, arising out of the use of a vehicle.” Porém, na versão portuguesa do artigo 1.º consta o seguinte: “Artigo 1.º – sem prejuízo do n.º 1, segundo parágrafo, do artigo 2.º da Directiva n.º 84/5/CEE, o seguro referido no n.º 1 do artigo 3.º da Directiva n.º 72/166/CEE cobrirá a responsabilidade por danos pessoais de todos os passageiros, além do condutor, resultantes da circulação de um veículo.” Como refere Calvão da Silva (em anotação ao acórdão Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Outubro de 2007, in Revista de Legislação e de Jurisprudência , Ano 137.º, n.º 3946, pp. 45/46): «Numa primeira leitura, todos os passageiros, «além do condutor», incluiria o próprio condutor: a letra con- duziria a esse resultado. Só que, confrontada a versão portuguesa do transcrito artigo 1.º da 3.ª Directiva Automóvel com as versões do mesmo artigo noutros idiomas, o alcance do preceito é precisamente o oposto: responsabilidade por danos pessoais de todos os passageiros, excepto o condutor. Vejam-se neste sentido as seguintes versões:
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