TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
293 ACÓRDÃO N.º 19/10 Vítor Gomes) – Vítor Gomes (vencido, conforme declaração anexa) – Gil Galvão (votei a decisão por enten der, no essencial, que, no caso, estando sempre em discussão a alegada violação de um direito, liberdade ou garantia, não constitui surpresa, para efeitos do princípio do contraditório, uma decisão com fundamento na reserva que à Assembleia da República cabe naquelas matérias). DECLARAÇÃO DE VOTO Votei a decisão, mas fi-lo, fundamentalmente, pelos motivos seguintes: É para mim claro – ao contrário do que se diz no Acórdão, que refere a este propósito a inexistência de um “entendimento pacífico” – que há identidade da questão de direito, quando se invocam, a propósito do juízo relativo a uma norma infraconstitucional, diferentes normas ou “parâmetros” constitucionais. A questão de constitucionalidade é una, não variando, na sua essência e na sua natureza, consoante se invoque este ou aquele preceito da Constituição. Não existem tantas questões de constitucionalidade – entendidas como outras tantas e diferentes “questões de direito” – quantas as normas eventualmente decorrentes do texto constitucional. O princípio da unidade da Constituição impede que assim seja. Nem tão-pouco me parece que possa existir uma divisão cerce, e ineliminável, entre a chamada “parte dogmática” da Consti- tuição – que consagra princípios ordenadores do Estado e da Sociedade, bem como normas de direitos fundamentais – e a sua “parte orgânica”, que define as competências dos órgãos de poder, as formas dos seus actos ou os seus procedimentos. Em última análise, as normas de direitos fundamentais só poderão vir a ser cumpridas se cumpridas forem, também, as normas de organização, competência e procedimentos; as duas partes da Constituição estão estritamente interligadas, justamente porque não podem deixar de ser vistas como elementos de um sistema , dotado de unidade de sentido. – Maria Lúcia Amaral. DECLARAÇÃO DE VOTO Vencido. Concederia provimento ao recurso, nos termos do projecto que apresentei, essencialmente pelo seguinte: 1. Dentro do objecto do processo, a inconstitucionalidade é, em qualquer das suas modalidades, seja qual for o elemento do acto normativo desconforme a normas e princípios constitucionais uma quaestio juris de conhecimento oficioso e o juiz não está adstrito aos fundamentos ou parâmetros invocados pelas partes (artigo 204.º da CRP). Todavia, nem a oficiosidade nem o princípio jus novit curia justificam que as questões de constitucio- nalidade sejam decididas sem que as partes tenham efectiva possibilidade de contribuir para a formação da decisão do tribunal. A mais do contraditório stricto sensu, o processo justo e leal exige a participação dos inte ressados tanto nos aspectos de facto como de direito, não podendo a descoberta dos fundamentos jurídicos da decisão resultar de um solilóquio do juiz. O direito de influir no desenvolvimento da controvérsia e no conteúdo da decisão seria intoleravelmente comprimido se, posta em causa a constitucionalidade de uma dada norma, o juiz pudesse decidir pela inconstitucionalidade com qualquer outro fundamento, mesmo que estranho ao tipo de inconstitucionalidade invocada. Objectar-se-á que isto comporta o risco de uma cadeia interminável de intervenções. Mas sem razão. Não se trata de impor ao juiz que sistematicamente comunique às partes a própria orientação e valoração do caso previamente à decisão [mas já assim se pensou; cfr. NicolòTrocker, Processo Civile e Costituzione , pp. 757] ou de um dever de auscultação das partes perante a mínima variação dos pressupostos normativos da decisão
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