TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
283 ACÓRDÃO N.º 17/10 2.5. A jurisprudência do TEDH Também com relevância para o caso em apreço, importa ter presente que o artigo 6.º, n.º 3, alíneas c) e d) , da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, dispõe que o acusado tem inter alia o direito de defender-se a si próprio e de interrogar ou fazer interrogar as testemunhas de acusação. Segundo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, os referidos direitos só podem ser exercidos plenamente na própria audiência de julgamento, para a qual o acusado tem de ser adequa- damente notificado, sem prejuízo da possibilidade de ulterior renúncia ao direito de intervir na audiência (decisão do caso Colozza v. Italy, de 12 de Fevereiro de 1985, decisão do caso T. v. Italy, de 12 de Outubro de 1992, decisão do caso Somogyi v. Italy, de 18 de Maio de 2004, decisão do caso Sejdovic v. Italy, de 10 de Novembro de 2004, decisão do caso R. R. v. Italy, de 9 de Junho de 2006, disponíveis em www.echr.coe.int ). Nestes arestos, o TEHD, quanto à forma adoptada para efectuar a notificação do acusado para a audiência de julgamento, entendeu que os Estados Contratantes gozam de uma ampla discricionariedade na escolha dos meios utilizados para realizar a referida notificação, desde que seja garantida a efectividade do conhecimento pelo acusado através dos procedimentos legalmente previstos, não relevando, assim, um conhecimento presumido, vago ou informal. 2.6. Da constitucionalidade da interpretação normativa questionada No essencial, o recorrente entende que a notificação por aviso postal simples do despacho que designa dia para a audiência de julgamento não assegura a cognoscibilidade do acto notificando. Atenta a importância da presença e da intervenção do arguido na audiência de julgamento, acima colo- cada em evidência, é manifesto que a respectiva notificação deve assumir uma forma que permita assegurar, com alguma segurança, que o arguido teve efectivo conhecimento do acto notificando. Também ninguém questiona que a notificação por contacto pessoal é a forma mais segura de comuni- cação dos actos. Todavia, a solução legal da exigência da notificação do arguido por contacto pessoal, levanta sérios problemas, pois, quando pensada em termos sistemáticos para garantir o princípio do contraditório em todos os momentos processualmente mais relevantes, conduz necessariamente ao bloqueamento da admin- istração da justiça penal. Para alcançar essa conclusão, basta recordar que no âmbito do processo penal comum, em termos de normalidade, o arguido precisa de ser contactado e/ou convocado, pelo menos, em três momentos proces- suais relevantes para efeito de exercício do contraditório até ser proferida sentença em primeira instância: 1) notificação do arguido para efeito de prestação de declarações durante o inquérito; 2) notificação da acusação ao arguido; 3) notificação do despacho que designa data para a audiência de julgamento ao arguido. É por demais evidente que a exigência da notificação do arguido por contacto pessoal em todas as referi- das situações conduz a bloqueios óbvios e inaceitáveis ao longo de todo o procedimento criminal, sobretudo a partir do encerramento do inquérito e da dedução da acusação. Foi, aliás, a constatação dessa situação que motivou o legislador a substituir a notificação pessoal pela notificação através de envio de aviso postal para morada previamente indicada pelo arguido para esse fim, procurando assim consagrar uma solução que conciliasse a celeridade processual com a necessidade do argui- do ter um efectivo conhecimento da data da realização da audiência de julgamento para nela poder exercer os seus direitos de defesa. Não se esqueça que a celeridade processual em matéria penal também tem dignidade constitucional – já que todo o arguido deve ser julgado no mais curto prazo e até pode ser julgado na ausência –, estando o legis ladorordinário apenas obrigado a que as soluções adoptadas nesse sentido não comprometam as garantias de defesa do arguido (artigo 32.º, n.º 2, 2.ª parte, e n.º 6, da CRP).
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