TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
282 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O Tribunal Constitucional ainda não se pronunciou sobre a solução normativa que constitui o objecto do presente recurso de constitucionalidade, mas já teve oportunidade de apreciar a constitucionalidade da utilização da notificação postal simples noutros momentos do procedimento penal igualmente relevantes no plano das garantias de defesa, nomeadamente para efeito de comunicação ao arguido da sentença conde- natória e da decisão revogatória da suspensão da execução da pena de prisão. Assim, o Tribunal Constitucional não julgou inconstitucional a interpretação normativa que se traduz na notificação da sentença condenatória ao arguido por via postal simples para a morada indicada no termo de identidade e residência, na sequência de julgamento realizado na sua ausência, a seu pedido, por residir no estrangeiro, tendo sido assegurada a sua representação por defensor durante a audiência de julgamento (Acórdão n.º 111/07, publicado no Diário da República, II Série, de 20 de Março de 2007). Diversamente, o Tribunal Constitucional julgou inconstitucional a interpretação normativa que se tra- duz na notificação da decisão de revogação da suspensão da execução da pena de prisão ao arguido por via postal simples para a morada indicada no termo de identidade e residência (Acórdão n.º 422/05, publicado no Diário da República, II Série, de 22 de Setembro de 2005). Em ambas as situações, o Tribunal Constitucional não colocou em causa a eficácia da notificação por via postal simples em si mesma para assegurar a cognoscibilidade do acto notificando. Porém, no último aresto, o Tribunal Constitucional não pôde ser indiferente à circunstância do termo de identidade e residência se ter extinguido com o trânsito em julgado da sentença condenatória, com a consequente caducidade das obrigações assumidas pelo arguido relativamente à morada aí indicada para efeito de ulteriores notificações por via postal simples. A utilização da notificação por via postal simples iniciou-se no âmbito do processo civil, área onde também se faz sentir, ainda que com diferentes consequências, o peso do direito fundamental a um processo equitativo e da proibição da indefesa, que acabam por ser transversais a todos os ramos de direito adjectivo. Efectivamente, basta ter presente que numa acção cível declarativa, a mera revelia do demandado pode gerar consequências bastantes desfavoráveis, nomeadamente o efeito cominatório semi-pleno (confissão dos factos articulados pelo autor) que pode levar à rápida condenação do demandado no pagamento de quantias de valores muito elevados. Em particular, e com pontos de contacto evidentes com a situação sob análise, importa relembrar que, com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto, nas acções para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato reduzido a escrito, a citação passou a ser efectuada mediante o envio de carta simples, com prova de depósito, dirigida ao citando e endereçada para o domicílio ou sede que tenha sido inscrito naquele contrato para identificação da parte, excepto se esta tiver expressamente conven- cionado outro local onde se deve considerar domiciliada ou sediada para efeitos de realização da citação em caso de litígio, tudo acompanhado da concessão da dilação de 30 dias para o início do prazo de contestação (artigos 236.º-A, n. os 1, 5 e 6, e 252.º-A, n.º 3, do CPC). Ora, o Tribunal Constitucional foi também chamado a apreciar a conformidade constitucional desta nova solução legal e não a reputou inconstitucional à luz das exigências inerentes ao direito a um processo equitativo (Acórdão n.º 182/06, publicado no Diário da República, II Série, de 8 de Março de 2006). Segundo o Tribunal Constitucional, as exigentes formalidades e as especiais cautelas adoptadas no sistema de notificação por via postal simples ofereciam garantias suficientes de que o acto de comunicação seria colo- cado na área de cognoscibilidade do seu destinatário em termos de ele poder exercer os seus direitos de defesa. Foi também então entendido que não surgia excessivamente oneroso para os particulares destinatários das comunicações judiciais, no âmbito do dever de colaboração com a justiça, enquanto manifestação de uma cidadania responsável, a manutenção, em condições de segurança, dos receptáculos existentes para a correspondência postal que lhes seja dirigida e a consulta regular dos mesmos.
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