TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010
272 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 7. Não sendo o arguido obrigado a conhecer todo o rol de notificações a que a lei alude (artigo 113.º do CPP) e que são inúmeras, a normalidade ou a legalidade dessa notificação, no caso sub juditio traduzir-se-ia na notificação efectuada pessoalmente, sendo essa a imposição da lei processual no referente à designação de dia para o julgamento (artigo 113.º, n.º 9, do CPP e sendo essa também a exigência do texto constitucional, artigo 32.º, n. os 1 e 6, e 20.º, n.º 4, da CRP). 8. Ora, in casu não poderia ter sido “dispensada” a presença do arguido (para a hipótese contida no texto cons- titucional no seu artigo 32.º, n.º 6, da CRP) uma vez que não foram, previamente a essa “dispensa”, assegurados os direitos de defesa do arguido, exigência contida nesse mesmo preceito (o artigo 32.º, n.º 6, da CRP). E não foram assegurados, dada a inexistência de notificação pessoal. 9. Pelo que a recorrida decisão fez, com o devido respeito uma interpretação literal do artigo 113.º, n.º 9, e do artigo 196.º, n.º 3, ambos do CPP. Já que, apesar da exigência contida no artigo 113.º, n.º 9, do CPP (quanto à obrigatoriedade de notificação pessoal do arguido neste caso), a instância partiu do princípio (e isso ressalta na sua decisão) de que se o recorrente não recebeu a carta foi porque não quis recebê-la e que face ao disposto no artigo 196.º do CPP o arguido estaria então “regularmente notificado”. 10. Por isso se entende que o decidido viola a Constituição e a lei penal adjectiva, porquanto não é esse o sen- tido do artigo 32.º da CRP ou do 20.º, n.º 4, da CRP não sendo também esse o sentido do artigo 113.º, n.º 9, ou do artigo 196.º, n.º 3, ambos do CPP. 11. No caso concreto, esse mesmo direito de defesa do recorrente (como o direito inalienável de ser notificado pessoalmente da data da audiência) foi postergado pela instância. Ora, “o que interessa é que (os preceitos legais)” tenham como parâmetro de validade imediata, não a lei (“outra lei”) – no caso o artigo 196.º do CPP – mas a Constituição (in douto Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 405/87), também sendo certo que “a validade do Direito não pode afirmar-se com total indiferença pelo seu conteúdo. Se a dimensão jurídica das leis ficasse redu- zida ao processo, o seu princípio normativo - material seria apenas o poder”, como já ensinava o insigne professor Castanheira Neves. 12. Num caso como o dos autos em que estava em causa um direito fundamental, a decisão tomada pela instância violou o texto Constitucional, também no sentido em que esqueceu que há leis com uma densificação material determinada, como por exemplo as leis que incidem sobre os actos organizadores dos direitos, liberdades e garantias. A recorrida decisão perfilhou, em nossa opinião, uma visão não substancialista da lei, recusando um critério constitucional - material caracterizador da função legislativa. 13. É que, no caso concreto, o artigo 113.º, n.º 9, do CPP tem necessariamente dimensão substantiva – mate- rial e não apenas processual ou organizatória. E assim equacionada a questão, dúvidas não restam que o disposto no artigo 196.º, n.º 3, alínea d) , do CPP (que ainda assim não teria aplicação neste caso dado o arguido nada ter incumprido), sempre deveria ceder face ao comando do artigo 113.º, n.º 9, do CPP (único preceito a regular, espe- cificamente a génese da notificação do arguido para o dia da audiência), bem como à exigência contida no próprio texto Constitucional e Constitucional-Europeu [artigo 32.º, n.º 5, e outros 32.º, n.º 1, artigo 20.º, n.º 4, e maxime artigo 6.º, n.º 3, alínea b) , da CEDH]. 14. Na verdade, dispondo o artigo 6.º, n.º 3, alínea b) , da Convenção Europeia dos Direitos do Homem que «todo o acusado tem, como mínimo, e entre outros, o direito de “Dispor do tempo e dos meios necessários para a preparação da sua defesa», é por demais óbvio que no caso concreto o recorrente não teve nem o tempo nem os meios necessários para a preparação da sua defesa. 15. Daí a suscitada inconstitucionalidade material do mencionado artigo 113.º, n.º 9, do CPP se ou quando interpretado no sentido ou com a dimensão normativa de que num caso como o dos autos o arguido não deveria ser notificado pessoalmente, apenas porque a carta que o Tribunal lhe endereçou veio devolvida pelos CTT com a indicação aposta no verso de p. 241. O parâmetro constitucional desse modo violado é o constante do artigo 32.º, n. os 1, 5 e 6, da CRP (já que a excepção de julgamento aqui prevista é para casos muito diferentes do destes autos, ou seja, para aqueles específicos casos em que ao arguido é previamente “assegurado o direito de defesa”), tendo-se ainda violado, por erro interpretativo, o disposto no artigo 18.º, n.º 2, da CRP ao majorar-se o estatuído no artigo
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