TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

265 ACÓRDÃO N.º 16/10 ser interposto em condições de total conhecimento dos seus pressupostos), nos casos em que o pedido de correcção da sentença se baseia num erro, ambiguidade ou obscuridade inexistente (podendo até constituir, como muitas vezes acontece, mera manobra dilatória do recorrente), revelando-se, pelo contrário, preju- dicial quando confrontada com situações em que verdadeiramente se verifique tal erro, ambiguidade ou obscuridade da sentença. Nesta segunda hipótese, a decisão de que se pretende recorrer não é integralmente conhecida, ou porque contém uma divergência entre o que ficou escrito e o que estava no pensamento do tribunal decidir, ou porque é obscura (por não se poder alcançar o seu sentido exacto) ou porque é ambígua (comporta dois ou mais sentidos distintos). Para estes casos (os que são verdadeiramente casos de aplicação do artigo 380.º do CPP), a ideia de que o prazo para interpor recurso deve começar a contar, para o arguido que pediu a correcção da sentença, do conhecimento da decisão que recaia sobre tal pedido de correcção (a qual é complemento e parte integrante da sentença corrigida ou aclarada) é o corolário lógico de se considerar que este incidente pós-decisório é necessário ao cabal conhecimento, por parte do recorrente, da decisão final do tribunal recorrido (a quem incumbe, em primeira linha, a apreciação de tal requerimento – cfr. artigo 380.º, n.º 1, do CPP) e, conse- quentemente, do exercício, em concreto, do direito ao recurso. O pedido de correcção da sentença surge porque o seu destinatário (arguido) a considera errónea, obscura ou ambígua. Até ser proferida decisão quanto a esse pedido, o requerente está (ou pode estar) colocado num estado de incerteza quanto aos termos finais da sentença em relação à qual tem que definir o seu interesse em recorrer e, na hipótese afirmativa, conformar o teor do seu recurso. O mesmo é dizer que, em determinadas circunstâncias, o resultado daquele incidente pós-decisório, qualquer que ele seja, é condicionante do adequado exercício do direito ao recurso, pois mesmo que o pedido de correcção venha indeferido, só com o conhecimento desta decisão poderá o arguido estar certo do alcance da sentença de que recorre e, consequentemente, construir a sua defesa em sede de recurso (ou até, decidir se toma, ou não, essa iniciativa processual). Só nesse momento, o arguido fica certificadamente, e em definitivo, na posse de todos os dados a ponderar na determinação da sua vontade, quanto ao «se» e ao «modo» do exercício do direito ao recurso. 11. Em face desta projecção da decisão quanto ao pedido de correcção sobre a efectivação do direito ao recurso, reconhecer-se-á, sem dificuldade, que a solução que, em grau máximo, preserva a garantia constitu- cional é a de estabelecimento de uma tramitação sucessiva, sem sobreposições temporais. Solução que exigiria que o termo inicial para a contagem do prazo de recurso viesse dado pela notificação da decisão do pedido de correcção da sentença de que se pretende recorrer. Contrapor-se-á que a interpretação dos artigos 380.º e 411.º do CPP adoptada na decisão recorrida persegue o objectivo legítimo de assegurar celeridade processual e de contrariar puros expedientes dilatórios, com isso se contribuindo para a boa administração da justiça. Nessa medida, a questão por ela suscitada distingue-se da apreciada no Acórdão n.º 384/98, que decidiu «julgar inconstitucional a norma contida no artigo 172.º, n.º 4, da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho (Estatuto dos Magistrados Judiciais), na interpretação feita pelo Plenário Geral do Tribunal de Contas, no sentido de o recorrente dever interpor o recurso de deliberação classificativa do concurso para juízes do Tribunal de Contas num momento em que ignora os fundamentos da decisão que pretende impugnar». Para além de aqui estar em causa a ignorância total dos fundamentos da decisão, foi entendido que «tal exigência traduz-se antes na imposição de uma formalidade limitadora do efectivo exercício do direito ao recurso e absolutamente alheia ao que possa ser a prossecução de um interesse racional e teleologicamente justificado». Mas há que ver que o facto de a finalidade da solução em causa aparecer credenciada constitucio­ nalmente não dispensa a apreciação da observância da proporcionalidade, quanto aos meios concretos de a atingir. Cumpre apreciar, designadamente, se essa solução se contém dentro dos limites da «necessidade» e da «justa medida», isto é, se ela é indispensável e não sacrifica desmesuradamente os valores associados à efectividade do direito ao recurso.

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