TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

264 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL venha a recair sobre aquele pedido, dispõe, desde logo de todos os elementos indispensáveis à elaboração do seu recurso, podendo formulá-lo contando com a rectificação, ou em termos de condicionalidade, de fácil conformação, sem ónus excessivos. Como salienta o Ministério Público, o caso dos autos é disso um bom exemplo, atento o tipo de recti- ficação que foi efectuada. Deve, no entanto, salientar-se que, neste caso, a irrelevância dessa rectificação só pode ser afirmada, com segurança, uma vez conhecido o despacho que recaiu sobre o requerimento de acla- ração, pois o teor desse requerimento não deixava antever necessariamente um tal desfecho (cfr. pp. 477/479 dos autos). Outros casos, no entanto, haverá, em que, não obstante estarem em causa pedidos de correcção que podem resultar em “modificações não essenciais” da sentença, e portanto subsumíveis no âmbito do artigo 380.º do CPP, o teor de tais pedidos revela a impossibilidade de formular adequadamente um recurso, antes de conhecida da decisão sobre ele. A título de exemplo, pense-se no caso em que o tribunal de primeira instância condena determinado arguido na pena de “x” meses de prisão, quando do teor da respectiva funda- mentação de facto e de direito resulta, inequivocamente, que se trata de um lapso de escrita, pois a pena pre- tendida aplicar era de “x” anos de prisão. Situações como esta têm sido entendidas como consubstanciando modificações não essenciais, como tal, enquadráveis no artigo 380.º do CPP − cfr., por exemplo, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Fevereiro de 1992 ( Colectânea de Jurisprudência , XVII, 1992, I, pp. 48-51), onde se decidiu que «é lícito corrigir a sentença através do processo estabelecido no artigo 380.º do CPP, quando, por manifesto erro, o tribunal escreveu no dispositivo pena diferente da que quis aplicar, e que indicara até na fundamentação». Note-se que, no caso exemplificado (em que na condenação se escreve “meses” de prisão, em vez de “anos”, como resulta da fundamentação) o erro colocaria o arguido numa posição de não poder decidir se interpunha, ou não, recurso, ficando para tal dependente da resposta que viesse a ser dada ao seu pedido de correcção, pois eventualmente estaria conformado com uma pena de “meses” de prisão, mas já não com uma condenação em “anos” de prisão. Outro exemplo pode facilmente ser conjecturado: num caso em que A e B são co-arguidos, pode, por manifesto lapso, constar da decisão (na parte final) a condenação de A em pena de prisão e a absolvição de B , quando, na verdade, resultava da fundamentação que se queria condenar B e absolver A . Também aqui se pode ter por admissível a correcção do erro da sentença, pois, como se decidiu, embora em caso não exactamente idêntico, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Março de 2003 ( Colectânea de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça , ano I, Tomo I, 1993, pp. 212 e segs.), «havendo a sentença laborado em confusão de nomes e de nacionalidade da pessoa física submetida a julgamento, o caminho a seguir, em tais circunstân- cias, é o da correcção do erro cometido, cuja eliminação não importa modificação essencial do julgado». Tal como no anterior, igualmente neste caso não estarão reunidas as condições para que os arguidos possam recorrer em simultâneo, ou na pendência, de um pedido de correcção da sentença. Na verdade, A (que foi condenado, mas que devia ter sido absolvido) ver-se-á obrigado a recorrer, por cautela, sendo certo que, após a correcção, perderá interesse (e até legitimidade) no recurso; enquanto que B não tem (antes dessa correcção) interesse em recorrer de uma sentença que, na decisão final, o absolve, mas já poderá tê-lo, uma vez efectuada a correcção. Estes exemplos e outros que se poderiam alinhar são demonstrativos de que nem sempre os erros ou lapsos – exclusivamente imputáveis ao tribunal, frise-se – são superáveis pelo arguido sem ónus despropor- cionados. De resto, as tipologias fenoménicas são muito variadas e de diferenciação gradativa, pelo que, sobretudo tratando-se de inexactidões ou omissões, a sua qualificação como erro ou lapso, ou obscuridade ou ambiguidade, é de molde a suscitar funda incerteza. Tudo ponderado, não cremos que se justifique decidir, nesta matéria, por um tratamento diferenciado dos dois grupos. Nessa decisão, há que ter em conta que a interpretação normativa que vem questionada tem o efeito perverso de se mostrar inócua (leia-se, irrelevante para o exercício do direito ao recurso, que desde logo pode

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