TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 77.º Volume \ 2010

126 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL toleradas por comportamentos do próprio Estado e os particulares não possam ou devam, razoavelmente, esperar alterações radicais no curso do desenvolvimento legislativo normal» ( Os princípios constitucionais estruturantes da República Portuguesa , Coimbra, 2004, p. 263). No entanto, face ao valor constitucional contraposto do interesse público, a que o legislador está também vinculado, o autor reconhece que «o alcance prático do princípio da pro- tecção da confiança só é delimitável através de uma avaliação ad hoc que tenha em conta as circunstâncias do caso concreto e permita concluir, com base no peso variável dos interesses em disputa, qual dos princípios deve merecer prevalência». E no plano da ponderação do peso das posições relativas dos particulares, acentua que «as expectativas têm de ser legítimas», excluindo que possam assumir qualquer relevo valorativo as posições sustentadas «em ilegali­ dades ou em omissões indevidas do Estado» ( idem , pp. 264 e 267) Também o Tribunal Constitucional tem já firmado o entendimento de que o princípio do Estado de direito democrático postula «uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e de segurança no direito das pessoas e nas expectativas que a elas são juridicamente criadas», conduzindo à consideração de que «a normação que, por natureza, obvie de forma intolerável, arbitrária ou demasiado opressiva àqueles mínimos de certeza e segurança jurídica que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar, como dimensões essenciais do Estado de direito democrático, terá de ser entendida como não consentida pela lei básica» (entre outros, o Acórdão n.º 303/90, in Acórdãos do Tribunal Constitucional , 17.º Vol., p. 65).” Por fim, no mesmo Acórdão ainda, o Tribunal definiu as condições de actuação do princípio da con­ fiança em matéria de sucessão de leis: “Referindo-se especificamente a situações de retrospectividade ou retroactividade inautêntica, o Tribunal Cons- titucional, no Acórdão n.º 287/90, teve também já oportunidade de definir a ideia de arbitrariedade ou excessiva onerosidade, para efeito da tutela do princípio da segurança jurídica na vertente material da confiança, por referên- cia a dois pressupostos essenciais:  a) a afectação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível, quando constitua uma mutação da ordemjurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dela constantes não possam contar; e ainda b) quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente prote- gidos que devam considerar-se prevalecentes (deve recorrer-se, aqui, ao princípio da proporcionalidade, explicitamente consagrado, a propósito dos direitos, liberdades e garantias, no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição). Os dois critérios enunciados (e que são igualmente expressos noutros arestos) são, no fundo, reconduzíveis a quatro diferentes requisitos ou “testes”. Para que haja lugar à tutela jurídico-constitucional da «confiança» é necessário, em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expectativas» de continuidade; depois, devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fun- dadas em boas razões; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspectiva de continuidade do «comportamento» estadual; por último, é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expecta- tiva (neste sentido, o recente Acórdão n.º 128/09).” Olhando para as normas impugnadas verificamos, em primeiro lugar, que apenas estão em causa direitos em formação, uma vez que as normas questionadas não afectam os direitos já adquiridos pelos funcionários públicos, relativamente à sua aposentação. Em segundo lugar, constata-se que muitas das alterações foram acompanhadas de regimes transitórios que visaram atenuar os seus efeitos relativamente àqueles que se encontravam mais próximos de se poderem reformar nos termos do regime revogado. Foi contemplado um aumento gradual da idade da reforma, as novas regras de cálculo da pensão ordinária afectam quase exclusivamente apenas uma parcela respeitante ao

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