40º Aniversário da Constituição da República Portuguesa
72 O novo constitucionalismo dirigente 40.º Aniversário da Constituição da República Portuguesa Colóquio Comemorativo « cogente e persuasiva » de que a medida adotada foi a menos intrusiva. Adicionalmente, ain- da, quando a resposta à questão de saber se um meio se revela necessário para a prossecução dum fim envolve o recurso a prognósticos, o Supremo Tribunal Canadiano não se coíbe de controlar esses prognósticos, através de testes que vão desde o controlo da evidência, passan- do pelo controlo da razoabilidade, podendo mesmo chegar a um teste de escrutínio intenso, consoante o tipo de política pública que esteja em causa 50 . As considerações anteriores poderiam facilmente ser entendidas como uma defesa do princípio da proporcionalidade enquanto instrumento mais adequado a controlar os atos do poder público, especialmente quando esteja em causa avaliação das medidas que limitam os direitos fundamentais. E, de facto, devem ser entendidas como tal. Mas com uma importante precisão. Como alternativa às diversas propostas mencionadas, pretendo simplesmente pôr em evidência que o princípio da proporcionalidade não exerce apenas uma função de submeter a justificação todas as decisões dos poderes públicos, mas também uma função de promoção da democracia. Ao lado da proporcionalidade como elemento essencial duma cultura da justificação não deve desprezar-se a ideia da proporcionalidade como elemento duma cultura política democrática. A razão para situar o princípio da proporcionalidade em ambas as dimensões assenta naquilo que já foi designado como « a viragem da interpretação para a justificação » 51 . Na verda- de, grande parte da atividade levada a cabo pelos tribunais constitucionais, quando apreciam a constitucionalidade de medidas legislativas restritivas de direitos fundamentais, diz respeito ao desenvolvimento de argumentação situada não tanto no domínio da interpretação jurídi- ca, mas sobretudo no domínio da justificação. E, na verdade, essa justificação é, por sua vez, desenvolvida a partir dum princípio (o da proporcionalidade) cuja base escrita é, no mínimo, modesta. Com efeito, essa base reconduz-se normalmente ao princípio do Estado de direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição, e à expressão equívoca ou ambivalente, contida no artigo 18.º, n.º 2, segundo a qual as restrições dos direitos devem « limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos ». Ora, a justificação em termos de razão pública não é, ao contrário da interpretação, uma atividade que possa ser considerada como exclusiva dos tribunais, em detrimento dos restantes poderes do Estado. A partir do reconhecimento deste facto, impõe-se explorar em que medida o princípio da proporcionalidade pode ser encarado, também, como uma forma de promover a demo- cracia. Stephen Gardbaum sugere três vias para o efeito 52 . Em primeiro lugar (i) , o princí- pio permite, através do modelo de análise dos direitos constitucionais em duas fases atrás mencionado, acomodar as exigências do princípio democrático e das decisões politicamente responsáveis adotadas pelo poder legislativo, por um lado, e, por outro, os limites a essas deci- sões subjacentes aos direitos fundamentais. O que o princípio da proporcionalidade consegue realizar, no contexto da sua função de promoção duma cultura política democrática, é uma média via entre dois extremos: por um lado, a completa incapacitação do processo político 50 Cf. Dieter Grimm, “Proportionality in Canadian and German Constitutional Jurisprudence”, in University of Toronto Law Journal , 57, 2007, pp. 390-391 e 395. 51 Cf. Mattias Kumm, “The Idea of Socratic Contestation and the Right to Justification: The Point of Rights-Based Proportiona- lity Review”, cit. , p. 144. O autor retira, todavia, desta viragem consequências opostas àquelas que surgemmencionadas no texto. 52 Cf. Stephen Gardbaum, “Proportionality and Democratic Constitutionalism”, cit. , pp. 271-274.
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