40º Aniversário da Constituição da República Portuguesa
44 O lugar da Constituição no século XXI 40.º Aniversário da Constituição da República Portuguesa Colóquio Comemorativo causa. Acresce que sob a égide da ONU se constituíram regras de direito internacional que, enquanto ius cogens, têm pretensão de validade, independentemente da sua aprovação pelos Estados, vinculando-os, além do mais, na celebração de convenções. O cumprimento das obrigações de direito internacional pode ser exigido junto dos tribunais internacionais. Apesar de as constituições nacionais serem potencialmente afetadas por este desenvolvi- mento, já que os Estados, devido aos constrangimentos do direito internacional, nem sempre podem levar a cabo tudo aquilo que as suas constituições permitem ou prescrevem, ou então, pelo contrário, são obrigados a praticar algo proibido pelas suas constituições, tal afetação muito raramente, ou mesmo nunca, se concretiza para a maioria dos Estados, uma vez que estes impedem que as violações da Carta das Nações Unidas lhes sejam imputadas. Através do seu direito de veto, os membros permanentes do Conselho de Segurança têm mesmo a possi- bilidade de assegurar juridicamente a sua proteção em relação a uma intervenção da ONU. É, assim, raramente percetível, a nível constitucional, esta rápida mutação do direito internacio- nal, ainda que algumas medidas antiterroristas da ONU que afetaram as garantias nacionais relativas aos direitos fundamentais tenham apurado a consciência de que tal possa acontecer. Na Europa, a situação é diferente. Em parte alguma se encontra tão desenvolvido um poder soberano supranacional como aqui. É certo que as intervenções da ONU podem pro- duzir efeitos massivos, mas é raro ocorrerem, já que a maioria dos Estados-Membros não oferece motivos para uma intervenção. O poder soberano alcançado pela ONU, ao contrário do que sucede com o nacional, além de ser estritamente limitado quanto à matéria, raramente é exercido, e, na maioria das vezes, apenas o é em relação a Estados individuais. A situação é diferente no âmbito da integração europeia. Os poderes públicos transferidos para as insti- tuições europeias não abrangem, é verdade, o uso da força física. Esta continua reservada aos Estados. Estes, porém, são constantemente expostos a atos soberanos europeus. É importante, neste contexto, fazer uma distinção entre o Conselho da Europa e a União Europeia. O Conselho de Europa atua sobre os Estados principalmente através do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, ao qual cabe garantir o respeito pela Convenção Europeia dos Direitos do Homem. A CEDH é aplicável nos Estados-Membros pelo facto de estes a terem ratificado, ocupando na hierarquia interna das normas jurídicas o nível que lhe tiver sido atribuído pelos Estados-Membros. O TEDH, por sua vez, pode apreciar se os atos dos Estados-Membros constituem uma violação da CEDH, mas não tem a faculdade de os anular em caso de infração. Fica limitado a um acórdão declarativo, cuja observância não pode ser imposta coercivamente. Nestes termos, a proteção europeia dos Direitos do Homem é efetivada dentro dos moldes tradicionais do direito internacional. Este quadro é, contudo, quebrado na medida em que não apenas os Estados possuem legitimidade processual para recorrer ao tribunal, mas também todos aqueles indivíduos que considerem que os seus direi- tos convencionais tenham sido violados por um Estado signatário. Os poderes da UE são, em comparação, muito mais amplos, pois os Estados-Membros transmitiram-lhe poderes de soberania, que ela exerce de forma autónoma. Isto afeta todas as áreas de atividade do Estado. Foram transferidos poderes legislativos, executivos e judicativos. Os atos que a UE, no exercício destes poderes, pratica – incluindo normas jurídicas – são diretamente aplicáveis nos Estados-Membros. Em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, estes atos gozam de primazia sobre o direito nacional, incluindo o direito que está na cúpula – as respetivas constituições dos Estados-Membros. O direito nacional que não estiver de acordo com o direito comunitário não pode ser aplicado,
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