40º Aniversário da Constituição da República Portuguesa
11 Joaquim de Sousa Ribeiro para a possibilidade de efetiva transposição da normatividade constitucional para uma realidade mutante. Transcorridos estes 40 anos, pode incontroversamente dizer-se que a Constituição superou a “prova do tempo”. Afirmou-se, mais do que como limite, como verdadeira dimen- são constitutiva do político, com presença real e atuante na vivência comunitária. Certamente que não se apagaram de todo as “querelas constitucionais”, muito vivas e quase permanentes na fase inicial, depois com alternância de momentos de emergência e mais prolongadas fases de latência. Mas, se persiste, em certos sectores, uma intenção reformista, creio não poder dizer-se que sobreviva, com expressão significativa, uma “questão constitucional”, no que isso significa de rejeição frontal do sistema e dos seus traços essenciais caracterizadores. E, de todo o modo, “só as constituições irrelevantes não são objeto de discussão”, como agudamente observou um dos nossos conferencistas, Dieter Grimm. Uma Constituição nunca pode estar fechada a aperfeiçoamentos e atualizações, pelo que a hipótese de revisão constitucional, mais ou menos alargada, deve ser encarada com absoluta normalidade, porque em completo acordo com a fisiologia do sistema e das suas previsões adaptativas. Mas os momentos constituintes não podem ser banalizados ou degra- dados quase como elementos de uma política conjuntural do dia-a-dia e dos enfrentamentos que lhe são inatos – em prejuízo da função estabilizadora e integrativa da Constituição e dos equilíbrios duradouros que só visões de longo prazo proporcionam. Até porque ficou definitivamente comprovado, pelo desenrolar da nossa história cons- titucional sob a égide desta Constituição, que, dentro dos seus parâmetros reguladores, cabem diferentes opções políticas, podem afirmar-se distintos modelos e executar-se diferenciados projetos de configuração da sociedade, de acordo com a correlação de forças político-par- tidárias e os resultados eleitorais por elas obtidos. A uma sociedade plural e democrática, é conatural a existência de conflitos, a confrontação de grupos de interesses e de portadores de valores contrastantes. Não cabe à Constituição eliminar esse permanente dissenso, forjando consensos artificiais, ainda que, naturalmente, não impeça convergências reais, e até as pro- mova, em questões fundamentais. É antes seu papel, atuando como referencial de estabiliza- ção e de pacificação, racionalizar juridicamente tais processos, fazendo-os desenrolar por for- mas e com os limites que torne a sua manifestação reciprocamente aceite, porque abrangida pelo pacto constitucional. E esse papel tem a Constituição de 76 – cremo-lo bem – desempenhado a contento. “Os 40 anos da Constituição merecem ser celebrados”, disse-o logo de início, e fica agora à vista porque não escasseiam motivos para festejarmos jubilosamente esta data. À Assembleia da República é de reconhecer um título especialmente legitimante para conceber e levar a cabo um programa comemorativo. Esse programa está gizado, publicitado e em começo de execução, e nele o Tribunal Constitucional e o seu Presidente participaram e participarão, com totais disponibilidade e empenho. Mas, dentro do conjunto de atos comemorativos, e associando-se a eles, não podia este Tribunal deixar de tomar uma iniciativa própria – como já o fez em comemorações anteriores de aniversários da Constituição. À Constituição deve o Tribunal Constitucional a sua existên- cia; sobre ela, desenvolve-se o seu labor e exercita-se a sua jurisdição, uma vez que lhe compete “dizer” o direito que da Lei Fundamental flui. Mas, inversamente, o Tribunal Constitucional, atuando como instância cassatória das normas em desconformidade com a Constituição, dá a
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