40º Aniversário da Constituição da República Portuguesa

10 Presidente do Tribunal Constitucional 40.º Aniversário da Constituição da República Portuguesa Colóquio Comemorativo Os 40 anos da Constituição da República Portuguesa merecem ser celebrados, não ape- nas como evocação do momento fundacional da matriz normativa do nosso Estado de direito democrático, mas também pelo que significam de duradoura e efetiva conformação, por esta ordem constitucional, do nosso percurso coletivo. Se a Constituição pôde atingir a maturidade que os 40 anos de vida traduzem, fê-lo porque soube, a um tempo, tanto romper com o passado como ir ao encontro dos anseios do presente. Teve que canalizar normativamente, de modo adequado, o formidável impulso emancipatório e libertador que o 25 de Abril de 74 desencadeara. Deu assim corpo à vontade de uma outra Constituição – logo expressa, como um dos seus objetivos nucleares, no Pro- grama das Forças Armadas – vontade alimentada, em primeira linha, pelo desejo de reposição e de incremento das liberdades, individuais e coletivas, civis e políticas, asfixiadas, durante décadas, pelo regime ditatorial deposto. Em reação e superação dessa experiência muito negativamente marcada na consciência coletiva, a Constituição de 1976, logo no seu texto originário, foi generosa no reconhecimen- to dos direitos da pessoa, enquanto tal, e enquanto cidadão titular de direitos de participação política. Atesta-o a consagração de um catálogo de direitos, liberdades e garantias, extenso nas previsões e intenso nas medidas tuteladoras. Mas a Constituição não instituiu apenas um novo regime político e uma nova ordem de liberdade. Desenhou também os traços fundamentais de uma nova ordem social, dando acolhimento normativo a exigências elementares de justiça quanto às condições reais de vida das pessoas – exigências expressas em participados movimentos de massas que o 25 de abril possibilitara. Daí a consagração de direitos dos trabalhadores e a fixação aos poderes públicos de incumbências concretas de atuação prestativa, no âmbito da efetivação de direitos funda- mentais sociais, económicos e culturais. Para além do seu significado específico, atinente a cada um dos bens objeto de tutela, esses direitos, no seu conjunto, dão substância aos valores cimeiros da liberdade e da igualdade, procurando assegurar a todos condições minimamente igualitárias de integração e de participação autónoma na vida social. A própria organização das estruturas económicas foi constitucionalmente concebida como instrumental ao objetivo de promoção do bem-estar e da qualidade de vida do povo e da igualdade real entre os portugueses – uma das tarefas fundamentais do Estado, assim expressa em norma própria. A organização do poder político, em termos que plenamen- te asseguram o funcionamento de uma moderna democracia representativa e participativa, coroa o sistema normativo da Constituição. No seu todo, o texto constitucional enuncia e desenvolve discursivamente um progra- ma normativo inteiramente condizente com o implicitamente contido na fórmula sincrética e lapidar do artigo 1.º Digamo-la mais uma vez, com toda a ênfase, na redação atual: «Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária». Esse programa multidimensional não se fechou hermeticamente sobre si próprio, numa rigidez imutável, mas pôde renovar-se, pelo exercício do poder constituinte, em reajustamentos correlativos ao evoluir do processo político e dos seus enquadramentos condicionantes. Mas essas sucessivas revisões, entre 1982 e 2005, se reconfiguraram, por vezes incisivamente, cer- tas matérias, foram executadas segundo as regras e com observância dos requisitos que a pró- pria Constituição prevê, sem ruturas e sem perda de identidade, contribuindo, também elas,

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