ACÓRDÃO N.º 23/06[1]
Processo n.º 885/05
Plenário
Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:
I. Relatório
1.O Procurador-Geral Adjunto em funções
neste Tribunal, como representante do Ministério Público, veio requerer em 4 de
Novembro de 2005, nos termos do artigo 281.º, n.º 3, da Constituição da
República Portuguesa, e 82.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do
Tribunal Constitucional (Lei do Tribunal Constitucional), a declaração, com
força obrigatória geral, da inconstitucionalidade da norma constante dos
artigos 1817.º, n.º 1, do Código Civil, aplicável por força do artigo 1873.º do
mesmo Código, enquanto prevê a extinção, por caducidade, do direito de
investigar a paternidade, em regra, a partir dos 20 anos de idade do filho.
Referiu o requerente que tal norma foi julgada
inconstitucional, por violação do princípio das disposições conjugadas dos
artigos 26.º, n.º 1, 36.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2, da Constituição da República
Portuguesa, através do acórdão n.º 486/04, de 17 de Julho, da 2.ª Secção,
confirmado pelo acórdão n.º 11/05, do Plenário, de 12 de Janeiro, e das
decisões sumárias n.ºs 114/05, de 9 de Março, e 288/05, de 4 de Agosto.
As normas do Código Civil que constituem objecto do pedido
dispõem como segue:
“Artigo
1817.º
1 – A acção de investigação de maternidade só pode ser
proposta durante a menoridade do investigante ou nos dois primeiros anos
posteriores à sua maioridade ou emancipação.
2 – Se não for possível estabelecer a maternidade em
consequência do disposto no artigo 1815.º, a acção pode ser proposta no ano
seguinte à rectificação, declaração de nulidade ou cancelamento do registo
inibitório, contanto que a remoção do obstáculo tenha sido requerida até ao
termo do prazo estabelecido no número anterior, se para tal o investigante
tiver legitimidade.
3 – Se a acção se fundar em escrito no qual a pretensa mãe
declare inequivocamente a maternidade, pode ser intentada nos seis meses
posteriores à data em que o autor conheceu ou devia ter conhecido o conteúdo do
escrito.
4 – Se o investigante for tratado como filho pela pretensa
mãe, sem que tenha cessado voluntariamente esse tratamento, a acção pode ser
proposta até um ano posterior à data da morte daquela; tendo cessado
voluntariamente o tratamento como filho, a acção pode ser proposta dentro do
prazo de um ano a contar da data em que o tratamento tiver cessado.
5 – Se o investigante, sem que tenha cessado
voluntariamente o tratamento como filho, falecer antes da pretensa mãe, a acção
pode ser proposta até um ano posterior à data da morte daquele; tendo cessado
voluntariamente o tratamento como filho antes da morte deste, é aplicável o
disposto na segunda parte do número anterior.
6 – Nos casos a que se referem os n.ºs 4 e 5 incumbe ao réu
a prova da cessação voluntária do tratamento no ano anterior à propositura da
acção.”
“Artigo
1873.º
É aplicável à acção de investigação de paternidade, com as
necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1817.º a 1819.º e 1821.º.”
2.O
pedido formulado fundamenta-se na circunstância de a norma referida ter sido
julgada inconstitucional, pelo Tribunal, em três casos concretos.
Estes casos concretos, em que tal norma foi julgada
inconstitucional, foram os decididos pelos acórdão n.º 486/04, de 7 de Julho de
2004, da 2.ª Secção, confirmado pelo acórdão do Plenário n.º 11/05, de 12 de
Janeiro de 2005, e pelas decisões sumárias n.ºs 114/05 e 288/05, de 9 de Março
de 2005, da 3.ª Secção, e de 4 de Agosto de 2005, da 1.ª Secção,
respectivamente.
Em todas as decisões referidas o Tribunal considerou que a
norma em causa viola as disposições conjugadas dos artigos 26.º, n.º 1, 36.º,
n.º 1, e 18.º, n.º 2, da Constituição.
Admitido o pedido, foi notificado o Primeiro-Ministro para,
querendo, se pronunciar, no prazo de 30 dias, o que veio a fazer em 5 de
Dezembro, oferecendo o merecimento dos presentes autos.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentos
3.Não há
dúvida de que se verificam os pressupostos do pedido previstos nos artigo
281.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa e artigo 82.º da Lei do
Tribunal Constitucional, pois nas três decisões indicadas pelo requerente foi
julgada inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos
26.º, n.º 1, 36.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2, da Constituição, a norma do artigo
1817.º, n.º 1, aplicável por força do artigo 1873.º do mesmo Código, enquanto
prevê, para a caducidade do direito de intentar acção de investigação da paternidade,
um prazo de dois anos a partir da maioridade.
A fundamentação do aludido juízo de inconstitucionalidade
foi carreada ao acórdão n.º 486/04, confirmada pelo acórdão n.º 11/05, e
mantida, com remissão para estes acórdãos, pelas decisões sumárias n.ºs 114/05
e 288/05. Recorde-se tal fundamentação:
«9. O Tribunal Constitucional já se debruçou várias vezes
sobre a questão da constitucionalidade dos prazos para propositura de acções de
investigação de paternidade.
Fê-lo, quanto ao artigo 1817.º, n.ºs 3 e 4 (na redacção
dada pelo Decreto‑Lei n.º 496/77, de 25 de Novembro), nos acórdãos n.ºs
99/88 (publicado no DR, II Série, de
22 de Agosto de 1988) e 370/91 (Boletim
do Ministério da Justiça, n.º 409, págs. 314 e segs.), nos quais concluiu
pela inexistência de inconstitucionalidade – embora, neste último aresto,
apenas desde que a norma do n.º 4 fosse “interpretada no sentido de que a
cessação do tratamento como filho só ocorre quando, continuando a ser possível
esse mesmo tratamento, o pretenso pai lhe ponha voluntariamente termo” (solução
que veio a ficar consagrada na lei em 1998).
Por sua vez, nos acórdãos n.ºs 413/89 (DR, II Série, de 15 de Setembro de 1989), 451/89 (DR, II Série, de 21 de Setembro), 311/95 (inédito), e, por último, 506/99
(publicado em Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 44.º vol., pág. 763), o Tribunal Constitucional
pronunciou-se no sentido da não inconstitucionalidade do artigo 1817.º, n.º 1.
Recentemente,
pelo acórdão n.º 456/2003, tirado nesta 2.ª secção, foi apreciada, num recurso interposto
ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do
artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, a constitucionalidade da norma
do artigo 1817.º, n.º 2, aplicável por força do artigo 1873.º do Código Civil,
num caso em que estava em causa saber se ficava impedida “a investigação de
paternidade a quem, depois dos 20 anos (no caso, 31 anos, como se mencionou),
for surpreendido pela procedência de uma acção de impugnação da sua paternidade
instaurada por um terceiro (aqui, pela pessoa que era tida como seu pai)”. Tendo
o presumido pai impugnado com sucesso a presunção de paternidade, o filho,
apesar de ter ficado com a paternidade em branco, estava impedido de intentar
acção de investigação da paternidade, já que o n.º 2 do artigo 1817.º exige que
a remoção do obstáculo (no caso, o cancelamento do registo inibitório) seja
requerida até ao termo do prazo estabelecido no número anterior, de dois anos
após a maioridade ou emancipação, o qual já havia expirado há muito. O Tribunal
negou provimento ao recurso por ter concluído pela inconstitucionalidade da
norma em questão, por violação do direito à identidade pessoal.
Tal aresto
não se pronunciou, porém, sobre a conformidade com a Constituição do regime geral do artigo 1817.º, n.º 1, do
Código Civil, ao limitar aos “dois primeiros anos posteriores à sua maioridade
ou emancipação” a possibilidade de o interessado, sem paternidade estabelecida
(como no presente caso) interpor acção de investigação de paternidade,
mantendo-se, quanto a tal norma, a jurisprudência deste Tribunal,
consubstanciada nos arestos citados, que têm concluído pela não
inconstitucionalidade dessa limitação temporal.
A linha
central de fundamentação dessas decisões assenta na consideração de que as
normas em questão – e em particular o n.º 1 do artigo 1817.º, agora em causa –
resultam de uma ponderação de vários
direitos ou interesses contrapostos, a qual conduz, não propriamente a uma
restrição, mas a um condicionamento aceitável do exercício do direito à
identidade pessoal do investigante. Tal ponderação é resumida, claramente, logo
no citado acórdão n.º 99/88 – e retomada em vários dos posteriores arestos
citados –, designadamente no seguinte trecho:
“Tudo está
em que, face ao direito do filho ao reconhecimento da paternidade, se perfilam
outros direitos ou interesses, igualmente merecedores de tutela jurídica: em
primeiro lugar, e antes de mais, o interesse do pretenso progenitor em não ver
indefinida ou excessivamente protelada uma situação de incerteza quanto à sua paternidade,
e em não ter que contestar a respectiva acção quando a prova se haja tornado
mais aleatória; depois, um interesse da mesma ordem por parte dos herdeiros do
investigado, e com redobrada justificação no tocante à álea da prova e às
eventuais dificuldades de contraprova com que podem vir a confrontar-se; além
disso, porventura, o próprio interesse, sendo o caso, da paz e harmonia da
família conjugal constituída pelo pretenso pai. É o equilíbrio entre o direito
do filho e este conjunto de interesses que normas como as dos n.ºs 3 e 4 do
art.º 1817.º do Código Civil visam assegurar, sem que se possa dizer que o
façam de modo desproporcionado (isto é, com excessivo sacrifício daquele
direito) –
quer considerado o estabelecimento, em si, de prazos de caducidade, quer
considerada a duração de tais prazos. E como todos os interesses em presença
não deixam igualmente de encontrar ressonância constitucional – seja ainda nos art.ºs 25.º, n.º 1 (integridade
moral), e 26.º, n.º 1 (direito à reputação e à reserva da intimidade da vida
privada e familiar), seja no art.º 67.º (protecção da família), seja só no
valor da segurança e certeza do direito, já que a tal valor objectivo, que
intimamente se conexiona com o direito à protecção jurídica (art.º 25.º), não
pode negar-se semelhante dignidade num Estado justamente ‘de direito’ – eis como não pode ver-se excluída pela
Constituição a solução consagrada pelo legislador nos preceitos questionados.”
A questão a que cumpre dar resposta
no presente recurso é a de saber se é de reiterar a conclusão no sentido da
inexistência de inconstitucionalidade da norma do artigo 1817.º, n.º 1, do
Código Civil, designadamente, com a fundamentação transcrita.
10. Importa começar por deixar bem vincado que, na averiguação da
conformidade constitucional da solução limitativa, actualmente consagrada na
norma ora em apreço, o que está em questão não é qualquer imposição constitucional de uma “ilimitada (…) averiguação da verdade biológica da filiação”. Pese embora a tese defendida pelo recorrente, de que qualquer
caducidade da acção de investigação de paternidade é inconstitucional, no
presente recurso está apenas em questão o concreto
limite temporal previsto no artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil, de dois
anos a contar da maioridade ou emancipação (portanto, no máximo, os vinte anos
de idade do investigante). Não constitui, assim, objecto do presente processo
apurar se a imprescritibilidade da acção corresponde à única solução
constitucionalmente conforme. Antes o que está em causa é, apenas, a
constitucionalidade da específica limitação
prevista nesta norma, que (salvo casos excepcionais, como o da existência
de “posse de estado”) exclui o direito a averiguar a paternidade depois dos 20
anos de idade: a acção “só pode ser proposta durante a menoridade do
investigante ou nos dois primeiros anos posteriores à sua maioridade ou
emancipação”. É este limite temporal
de “dois anos posteriores à maioridade ou emancipação”, e não a possibilidade
de um qualquer outro limite, que
cumpre apreciar – e, consequentemente, só sobre aquele específico limite
temporal, previsto actualmente no artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil, se
poderá projectar o juízo de (in)constitucionalidade a proferir.
Nem é,
aliás, o regime de imprescritibilidade a única alternativa pensável ao regime
do artigo 1817.º, n.º 1, do actual Código Civil. Importa, na verdade,
considerar que a norma em apreço exclui a possibilidade de investigar a
paternidade depois de esgotado um prazo de dois
anos que se conta a partir de um dies
a quo puramente objectivo, isto
é, que não depende de quaisquer elementos relativos à possibilidade concreta do
exercício da acção – como, por exemplo, a procedente impugnação da paternidade
(cfr., sobre esta hipótese, o já citado acórdão n.º 456/2003), fundadas dúvidas
sobre a paternidade que esteja estabelecida, ou, mesmo em caso de inexistência
de paternidade determinada, o conhecimento ou a cognoscibilidade supervenientes
de factos ou circunstâncias que possibilitem ou justifiquem a investigação.
Aliás, é também logo por estes
elementos serem irrelevantes no regime legal, e antes o prazo, de apenas dois
anos, se contar imediatamente a partir da maioridade ou emancipação, mesmo que
não existam quaisquer elementos relativos ao possível ou provável progenitor (ou,
por exemplo, para duvidar de uma paternidade estabelecida, ou apenas
socialmente conhecida), que também não pode proceder, como justificação para a
exclusão do direito à investigação da identidade dos progenitores, a invocação
da inércia ou do desinteresse do filho nesta investigação. Tal ideia (“dormientibus non succurrit jus”)
pressuporia que o prazo apenas se contasse a partir do momento em que se tornou
possível a acção, ou, pelo menos, que o prazo para ela, ainda que contado a
partir de um dies a quo objectivo,
fosse muito mais alargado. A inércia ou pouca diligência do filho na promoção
da investigação não é, pois, normalmente referida como fundamento para a
admissibilidade do regime ora em questão, que, reconhecendo um direito (ou a
dimensão de um direito) fundamental dirigido ao conhecimento da paternidade,
costuma apoiar-se, antes, na existência de outros valores ou interesses, dignos
de tutela, que seriam susceptíveis de justificar a exclusão do direito a
averiguar a filiação biológica, ou de relativizar esta.
Seja como for – e é o ponto que, para
deixar claro o alcance do juízo que o Tribunal profira, importa frisar –, no
presente processo está apenas em
apreciação o prazo de dois anos a contar da maioridade ou emancipação, e não a possibilidade de um qualquer outro
limite temporal para a acção de investigação de paternidade, conte-se este
a partir também da maioridade ou da emancipação, ou tenha outro dies a quo.
11. A
possibilidade ilimitada correspondia
ao regime consagrado antes de 1966, no Código de Seabra – incluindo à data da
concepção e nascimento do investigante, ora recorrente –, segundo o qual as
acções podiam ser intentadas a todo o
tempo. Na verdade, o artigo 130.º do Código de Seabra proibia a investigação
da paternidade, salvo nos casos de escrito de pai, de posse de estado, de
estupro violento e de rapto. Mas essa regra foi alterada em 1910 pelo artigo
37.º do Decreto n.º 2, de 25 de Dezembro, que determinava que “acção de
investigação da paternidade ou da maternidade só pode ser intentada em vida do
pretenso pai ou mãe, ou dentro do ano posterior à sua morte, salvas as
seguintes excepções (...)”. Limitava-se, pois, o
direito a requerer a investigação da paternidade, mas determinante era o
momento da morte do pretenso pai.
Esta solução legal não deixou, todavia, de ser objecto de
críticas, por conduzir à possibilidade de instrumentalização da acção.
Salientava-se que a acção podia visar apenas a “exigência tardia de bens
materiais (…) extorquidos, quiçá muitas vezes com fraude, àqueles que desde há
muito tinham legítima expectativa sobre esses bens” – Gomes da Silva, O Direito da Família no futuro Código Civil
(segunda parte), BMJ, n.º 88,
1959, pág. 86. Além disso, o estabelecimento da paternidade seria importante
sobretudo quando os filhos eram pequenos, para atenuar, “na medida do possível,
(os) efeitos da ilegitimidade sobre a formação da personalidade”. Procurava-se,
assim, quer “fomentar o mais possível as perfilhações provocadas e os reconhecimentos
oficiosos”, quer “encaminhar as coisas por forma a que as investigações feitas
por iniciativa dos filhos ou seus representantes, se efectuem o mais cedo
possível, precisamente quando mais úteis podem ser aos filhos e quando envolvam
menos riscos de fraudes contra a família legítima” (ob. cit., pág. 87). O prazo
de dois anos previsto no Código de 1966 era, pois, visto como forma de “combate
à investigação como puro instrumento de caça à herança paterna e de estímulo à
determinação da paternidade (e, em casos muitíssimo menos frequentes, da
maternidade) em tempo socialmente útil” (Pires de Lima e Antunes Varela, Código
Civil Anotado, vol. V, artigos
1796.º a 2023.º, Coimbra, 1995, pág. 83).
Pode dizer-se que, para além da maior conveniência na
constituição da paternidade quando ela ainda é mais útil, são aduzidas
fundamentalmente três razões para a
previsão de um prazo limitativo da acção de investigação (cfr., por exemplo,
Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., págs.
80 e ss., Guilherme de Oliveira, Critério
Jurídico da Paternidade, págs. 100 e segs. e 463-471, e, recentemente, a
descrição, que se segue, em Caducidade
das acções de investigação, Revista Lex Familiae, n.º 1, Centro de Direito
da Família, Coimbra, 2004, págs. 7-13).
Em primeiro lugar, invoca-se a “segurança jurídica” dos pretensos pais e seus herdeiros. A previsão
de um prazo de caducidade anda, aliás, sempre ligada à ideia de segurança
jurídica, pode não dever quem pode vir a ser onerado com o exercício de
pretensões alheias estar sujeito indefinidamente a que essa possibilidade de
exercício paire indefinidamente sobre a sua cabeça. Não sendo a acção intentada
até aos 20 anos (e passado, assim, o período em que mais falta faz um pai ou
uma mãe), não haveria, pois, que permitir o prolongamento da indefinição quanto
ao estabelecimento dos vínculos de filiação.
Em segundo lugar, esgrime-se com o progressivo “envelhecimento” ou perecimento das provas. Isto, sobretudo, em litígios – como os
relativos à paternidade – de prova difícil, relativa a factos íntimos e
naturalmente geradores de emoções. Na falta de prova pré-constituída decisiva,
a passagem do tempo potenciaria os perigos, designadamente, da prova
testemunhal, aumentando a possibilidade de fraudes. Assim, mesmo sendo certo
que, via de regra, seria sobretudo o próprio investigante retardatário a
suportar a desvantagem da dificuldade acrescida de prova – pelo que não parecia
“curial limitar-lhe o direito de investigar para lhe garantir o êxito da
prova”, como já em 1979 referia Guilherme de Oliveira (Estabelecimento da Filiação, Coimbra, 1979, pág. 41) –, tal razão
não terá deixado de pesar na previsão do prazo em questão.
Em terceiro lugar, avançava-se com um argumento atinente às
finalidades dos investigantes, que frequentemente seriam puramente egoísticas, próximas de sentimentos de cobiça, quando os pretensos pais estavam
no fim da vida. A imprescritibilidade das acções de filiação permitia tais
“caças à fortuna”, atrasando o estabelecimento da paternidade da juventude do
filho, em que o poder paternal é mais necessário, para a proximidade da morte
do pretenso pai. E este seria mesmo um dos maiores inconvenientes da regra
consagrada no artigo 37.º do Decreto n.º 2, de 25 de Dezembro de 1910.
O Código Civil de 1966 estabeleceu, pois, no artigo 1854.º,
n.º 1, o regime que ainda hoje vigora quanto ao prazo-regra em caso de falta de
escrito de pai ou de tratamento como filho: esse prazo termina dois anos depois
da maioridade do filho. E mesmo a reforma de 1977 entendeu não alterar este
ponto, provavelmente por se entender que ele traduzia uma limitação
proporcionada do direito de investigar a paternidade, para defesa de interesses
importantes como eram a segurança jurídica, a viabilidade prática das acções de
investigação, e o impedimento de um mau exercício dos direitos, para
finalidades censuráveis. E, de todo o modo, ao pretenso filho ficaria ainda,
mesmo com a caducidade, uma considerável liberdade de intentar a acção, de tal
modo que não se podia dizer que a tal restrição temporal fosse inconstitucional,
por afectar o conteúdo essencial de direitos fundamentais do filho.
12. A solução adoptada na ordem jurídica portuguesa a
partir de 1967, não sendo inédita no panorama comparatístico, não corresponde, porém, à adoptada na grande
maioria das ordens jurídicas que nos são mais próximas.
Assim, por
exemplo, o artigo 270.º do Código Civil italiano dispõe que a acção para obter
a declaração judicial da paternidade ou da maternidade “é imprescritível para o
filho”. Segundo o artigo 1606.º do Código Civil brasileiro, a “acção de prova
de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele
morrer menor ou incapaz” (a Lei n.º 8.560, de 29 de Dezembro de 1992 veio
regular a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento).
Nos termos do artigo 133.º do Código Civil espanhol, por sua vez, a “acção de
reclamação de filiação não matrimonial, quando falte a respectiva posse de
estado, cabe ao filho durante toda a sua vida”.
E também o
legislador alemão optou pela regra da imprescritibilidade: o artigo 1600e, n.º
1, do Código Civil alemão, prevendo a legitimidade do filho para a acção de
investigação (consagrada no artigo 1600d), não prevê qualquer prazo. Como se
salienta na doutrina:
“Não existe
em princípio qualquer prazo para a acção de investigação de paternidade. Se o
filho não tiver pai estabelecido, seja devido ao casamento, seja por
perfilhação, o seu progenitor pode ser judicialmente investigado a todo o
tempo, e, se for o caso, mesmo que o filho já seja há muito adulto. Pelo
contrário, se estiver estabelecida a paternidade (…), esta tem, em primeiro
lugar, de ser afastada por impugnação da paternidade (…), para que a via para a
investigação judicial de outro homem como pai fique livre. Como existem prazos
para isso (§1600b [que prevê um prazo de dois anos a contar do conhecimento de
circunstâncias que depõem contra a paternidade]), cujo decurso bloqueia também
a investigação judicial do verdadeiro pai, também existe mediatamente, nesta
medida, um prazo para a investigação judicial da paternidade”
(Palandt/Diederichsen, BGB, 59ª ed., Munique, 2000, anot. 4 ao § 1600d).”
Mesmo o
Código Civil de Macau, aprovado em 1999 e tendo como modelo o Código Civil
português de 1966, adoptou uma solução diferente da do legislador português: o
n.º 1 do artigo 1677.º dispõe, claramente, que “a acção de investigação da
maternidade pode ser proposta a todo o tempo”, sendo tal norma aplicável ao
reconhecimento judicial da paternidade por força da remissão do artigo 1722.º,
à semelhança do que acontece no Código Civil português (em compensação, para
evitar os inconvenientes de tal solução, nomeadamente por meros intuitos de
“caça à fortuna”, o artigo 1656.º, n.º 1, do Código de Macau veio prever duas
hipóteses em que o estabelecimento do vínculo produz apenas efeitos pessoais,
excluindo-se os efeitos patrimoniais).
Como se disse, porém, não é só no
nosso ordenamento que se encontra a previsão de um prazo de caducidade da acção
de investigação. Assim, no artigo 263.º do Código Civil suíço prevê-se que a
acção de investigação de paternidade pode ser intentada pela mãe até um ano
após o nascimento e pelo filho até ao decurso do ano seguinte ao da sua
maioridade (bem como, na hipótese de haver um vínculo de paternidade
estabelecido, no prazo de um ano após a dissolução desse vínculo). Mas, de
qualquer modo, existe no direito suíço uma cláusula geral de salvaguarda,
segundo a qual “a acção pode ser intentada depois do termo do prazo se motivos
justificados tornarem o atraso desculpável”. Já no direito francês, porém, a
acção deve ser proposta nos dois anos seguintes ao do nascimento (artigo 340-4
do Code Civil, na redacção da Lei n.º
93-22, de 8 de Janeiro de 1993), existindo alguns casos de excepção ao prazo
regra (se o pai e a mãe viveram em união de facto estável durante o período
legal de concepção, ou se houve participação do pretenso pai na educação da
criança). Se, porém, a acção não tiver sido exercida durante a menoridade da
criança, esta pode intentá-la durante os dois anos seguintes à maioridade (um
prazo, que, portanto, é neste ponto idêntico ao da norma ora em questão).
A maioria das ordens jurídicas
referidas – a bem dizer, todas as indicadas, salvo a francesa – não prevê,
pois, um regime tão limitativo como o da norma em causa no presente recurso.
Antes contêm, ou um regime semelhante ao que já vigorou entre nós, de imprescritibilidade da investigação de
paternidade, sem limite temporal para a acção (pelo menos quando a paternidade
não está estabelecida), ou uma cláusula de salvaguarda para um atraso
desculpável na propositura da acção.
Já em 1977 era, aliás,
significativa, também na doutrina, a
posição segundo a qual a acção de investigação de paternidade não deveria estar
submetida a um limite temporal. Como salientam Pires de Lima e Antunes Varela
(ob. e loc. cits.), nessa época “avolumara-se já em alguns sectores da doutrina
estrangeira a tese de que a investigação, quer da paternidade, quer da
maternidade, por respeitar a interesses inalienáveis do cidadão, incorporados
no seu estado pessoal, não devia ser limitada no tempo.”
Antes, ainda, de analisar os
parâmetros constitucionais em questão e as justificações referidas, com que
normalmente se procura fundamentar a solução de exclusão, em regra, do direito
à investigação da paternidade a partir dos vinte anos, importa, justamente,
referir que também entre nós se notam alterações em posições doutrinais.
Designadamente, a própria doutrina mais
frequentemente citada nos arestos deste Tribunal, no sentido da orientação
neles adoptada (Guilherme de Oliveira, em Critério Jurídico da Paternidade, Coimbra, 1983, págs. 463-471) pende hoje, expressamente, para a
inconstitucionalidade do regime em questão (assim, em Caducidade das acções de investigação, Revista Lex Familiae, cit., n.º 1, 2004, págs. 7-13, concluindo ser sustentável “alegar a
inconstitucionalidade dos prazos estabelecidos nos arts. 1817.º e 1873.º C.
Civ.”, tornando o regime inaplicável pelos tribunais, e devendo então o direito
dos filhos “poder ser exercitado a todo o tempo, durante a sua vida – contra o
suposto pai ou contra outros legitimados em seu lugar”; e salientando ainda ser
“conveniente ponderar não só o interesse dos familiares ou sucessores do filho
que morresse sem ter intentado a acção, mas também os interesses dos familiares
ou sucessores do suposto pai, contra quem havia de se dirigir a acção depois da
morte deste”, bem como a melhor forma de obviar a determinados casos-limite).
13. Na verdade, logo a partir da
Constituição de 1976, as exigências constitucionais em matéria de direitos de
personalidade e de direito da família tornaram-se incontornáveis na discussão
sobre o tema em causa.
A Constituição reconheceu um “direito de constituir família”, com um
sentido mínimo de impor ao legislador a previsão de meios para o
estabelecimento jurídico dos vínculos de filiação – os modos de perfilhar e a
acção de investigação. Esse direito foi, aliás, alargado pela reforma de 1977,
chegando a deixar o limite do vínculo de parentesco próximo apenas para o
reconhecimento oficioso, mas não para o estabelecimento voluntário da filiação
(mesmo sobre a restrição do incesto) por perfilhação ou acção de investigação.
Por outro lado, ainda no domínio
do direito da família, a Constituição proibiu a discriminação dos filhos nascidos fora do casamento (artigo 36.º,
n.º 4). Embora seja certo que, sendo as circunstâncias do nascimento diversas,
os modos de estabelecimento da paternidade não podem ser todos iguais,
existindo diferenças inevitáveis (o que é verdade, designadamente, para a
presunção de paternidade), é igualmente seguro que as diferenças de regime
inevitáveis não podem desfavorecer os filhos nascidos fora do casamento,
limitando-lhes excessivamente as possibilidades de estabelecimento da filiação.
Como salienta Guilherme de Oliveira (Caducidade...,
cit., pág. 9), uma vez que estes filhos não podem beneficiar de uma presunção
de paternidade do marido (pois não há marido), o reconhecimento dos meios para
estabelecer a paternidade deverá ter a maior abertura, tendencialmente, para
não limitar em demasia as possibilidades de estabelecimento da filiação dos
filhos nascidos fora do casamento (mediante a prova do vínculo biológico).
O parâmetro
constitucional mais significativo para aferição da legitimidade das limitações
ao direito de investigar a paternidade encontra-se, porém, no “direito à identidade pessoal”, com que abre logo o n.º 1
do artigo 26.º da Constituição.
Importa
notar, efectivamente, que a tese segundo a qual a norma em questão não é inconstitucional
não se baseia na inexistência de um direito
fundamental ao conhecimento da paternidade biológica, ou na exclusão deste
direito do “âmbito de protecção” do
direito fundamental à identidade pessoal, reconhecendo-se, antes, que o direito
do filho ao apuramento da paternidade biológica é uma dimensão deste direito
fundamental. Assim, na jurisprudência deste Tribunal não tem sido posta em
questão a existência de um interesse do filho, constitucionalmente protegido, a
conhecer a identidade dos seus progenitores, como decorrência dos direitos
fundamentais à identidade pessoal (e, também, do direito à integridade pessoal
– artigos 25.º, e 26.º, n.º 1, da Constituição). Neste sentido, escreveu-se,
por exemplo, no citado acórdão n.º 506/99:
“[n]ão se duvida da pertinência dos parâmetros constitucionais
convocados – o que, de resto, desde há muito a jurisprudência do Tribunal
Constitucional tem salientado.
Assim, poderá ilustrar-se essa
preocupação citando não só os já referidos acórdãos n.ºs. 99/88 e 370/91, como
também o n.º 451/89 […], e outro mais recente que daqueles se faz eco (acórdão
n.º 311/95, ainda inédito): na averiguação do vínculo real de parentesco, neles
se surpreendeu uma decorrência seja do direito fundamental à integridade
pessoal, com assento no n.º 1 do artigo 25º da Constituição da República, seja
do direito fundamental à identidade pessoal, acolhido no n.º 1 do artigo 26º do
mesmo texto, como expressão do entendimento já então professado por Guilherme
de Oliveira, segundo o qual o conhecimento da ascendência verdadeira é um
aspecto relevante da personalidade individual e uma condição de gozo pleno
desses direitos fundamentais (cfr. Impugnação
da Paternidade, in Boletim da
Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra – Suplemento XX, Coimbra,
1973, pág. 193; em Separata, Coimbra, 1979, pág. 66).”
E logo o citado acórdão n.º 99/88 não deixou de referir-se que
“(...) não
se vê como possa deixar de pensar-se o direito a conhecer e ver reconhecido o
pai (...) como uma das dimensões dos direitos constitucionais referidos, em
especial do direito à identidade pessoal, ou das faculdades que nele vai
implicada”.
O direito ao conhecimento da paternidade ou maternidade biológica, como
dimensão protegida pelos direitos fundamentais que são invocados como parâmetro
constitucional – nos quais se encontra também, por vezes, o direito a
constituir família, consagrado, sem restrições, no artigo 36.º, n.º 1, da
Constituição –, não é, pois, negado por este Tribunal, nos citados arestos.
Compreende-se,
aliás, que seja assim, pois o direito à identidade pessoal inclui, não apenas o
interesse na identificação pessoal (na não confundibilidade com os outros) e na
constituição daquela identidade, como também, enquanto pressuposto para esta
auto-definição, o direito ao conhecimento
das próprias raízes. Mesmo sem compromisso
com quaisquer determinismos, não custa reconhecer que saber quem se é remete
logo (pelo menos também) para saber quais são os antecedentes, onde estão as
raízes familiares, geográficas e culturais, e também genéticas (cfr., aliás,
também a referência a uma “identidade genética”, que o artigo 26.º, n.º 3, da
Constituição considera constitucionalmente relevante). Tal aspecto da
personalidade – a historicidade pessoal
(Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição
da República Portuguesa anotada, 3.ª ed., Coimbra, 1993, pág. 179, falam
justamente de um “direito à historicidade pessoal”) – implica, pois, a
existência de meios legais para demonstração dos vínculos biológicos em causa
(note-se, aliás, que os exames biológicos conducentes à determinação de
filiação podem ser realizados, fora dos processos judiciais, e a pedido de
particulares, sem qualquer limitação temporal, pelos próprios serviços do
Instituto Nacional de Medicina Legal, nos termos do artigo 31.º do Decreto‑Lei
n.º 11/98, de 24 de Janeiro), bem como o reconhecimento jurídico desses
vínculos.
Deve, pois, dar-se por adquirida
a consagração, na Constituição, como dimensão do direito à identidade pessoal,
consagrado no artigo 26.º, n.º 1, de um direito
fundamental ao conhecimento e reconhecimento da maternidade e da paternidade.
Simplesmente,
tem-se admitido que outros valores,
para além “da ilimitada recepção à averiguação
da verdade biológica da filiação – como os relativos à certeza e à segurança
jurídicas, possam intervir na ponderação dos interesses em causa”, como que
“comprimindo a revelação da verdade biológica”. Da perspectiva do pretenso pai,
aliás, invoca-se também, por vezes, o seu “direito à reserva da intimidade da
vida privada e familiar”: tal intimidade poderia ser perturbada, sobretudo se a
revelação for muito surpreendente, por circunstâncias ligadas à pessoa do
suposto pai ou pelo decurso do tempo, e poderá mesmo afectar o agregado
familiar do visado.
Também por estas razões, não se
tem chegado a uma decisão de inconstitucionalidade: numa “visão mais holística
da realidade”, sendo também “valores ligados à organização social a certeza e a
segurança”, admitiu-se, “como constitucionalmente incensurável uma solução
legislativa que fixe prazos de caducidade para a propositura deste tipo de
acções” (cfr. os acórdãos n.º.s 451/89, 413/89 e 506/99, já citados).
E isto, mesmo independentemente
da controvérsia em torno da qualificação do efeito da norma em causa como
verdadeira restrição a direitos
fundamentais ou “mero condicionamento”
do seu exercício, que, neste mesmo tema, se encontra reflectida em certa
jurisprudência do Tribunal Constitucional (cf. os citados acórdãos n.ºs 99/88 e
370/91). É certo que, por vezes, se tem invocado, em abono da inexistência de
inconstitucionalidade, que estaríamos apenas perante um “condicionamento” a que
tem de obedecer o exercício do direito do pretenso filho: mero condicionamento temporal da
admissibilidade da investigação judicial da paternidade, portanto, e não
verdadeira restrição a um direito fundamental.
A qualificação, do regime da
norma em causa, como uma verdadeira restrição a direitos fundamentais ou de um
“mero condicionamento” do seu exercício, não é, porém, isenta de controvérsia
(cfr. já a declaração de voto aposta ao acórdão n.º 99/88 pelo Cons. Luís Nunes
de Almeida; criticamente, quanto à qualificação como condicionamento, cfr., por
último, Jorge Reis Novais, As restrições
aos direitos fundamentais não expressamente autorizadas pela Constituição,
Coimbra, 2003, págs. 184 e ss. e 187 e ss., nota 322). Há, na verdade, que
atentar em que a distinção entre condicionamento e restrição é
“fundamentalmente prática, já que não é possível definir com exactidão, em
abstracto, os contornos das duas figuras”, constituindo, muitas vezes, “apenas
um problema de grau ou de quantidade” (J. C. Vieira de Andrade, Os direitos fundamentais da Constituição
Portuguesa de 1976, 2ª ed., Coimbra, 2001, pág. 217, e nota 49).
Seja, porém, como for quanto a
essa exacta qualificação e sua relevância – e também a normação legislativa
condicionadora está “sujeita ao controle dos limites (isto é, do respeito pelo
conteúdo do direito)”, como salienta Vieira de Andrade, ob. cit., pág. 213 –, é
claro que ela não pode ser o ponto de partida para a decisão da questão de
constitucionalidade. Não basta optar pela qualificação como norma restritiva ou
condicionadora para, aplicando ou não o regime do artigo 18.º da Constituição,
logo se concluir sobre a sua conformidade constitucional, tornando-se antes
necessário analisar, numa perspectiva substancial, se o tipo de limitação ao
direito fundamental em causa, pela gravidade
dos seus efeitos e pela sua justificação,
é ou não actualmente aceitável, à luz do princípio da proporcionalidade.
14. Na análise referida, não pode
ignorar-se a evolução dos elementos
relevantes para a questão de constitucionalidade, que, entre outras, tem
determinado também a alteração de soluções legislativas e doutrinais. Tal
alteração dos dados normativos do sistema (incluindo a nível constitucional) e
dos elementos sociológicos e científico‑técnicos, que como que “envolvem”
a questão de constitucionalidade do prazo de investigação de paternidade
previsto no artigo 1817.º do Código Civil, não deve, na verdade, ser
desconhecida, mesmo por quem conclua que, ainda assim, tal norma pode não
padecer de inconstitucionalidade.
Com efeito, tem-se verificado uma
progressiva, mas segura e significativa, alteração dos dados do problema, constitucionalmente relevantes, a favor
do filho e da imprescritibilidade da acção – designadamente, com o impulso
científico e social para o conhecimento das origens, os desenvolvimentos da
genética, e a generalização de testes genéticos de muito elevada fiabilidade.
Esta alteração não deixa incólume o
equilíbrio de interesses e direitos, constitucionalmente protegidos,
alcançado há décadas, e sancionado também pela jurisprudência, empurrando-o
claramente em favor do direito de
conhecer a paternidade.
Grande parte da responsabilidade
vai, aqui, para o peso dos exames científicos nas acções de paternidade e para
a alteração da estrutura social e da riqueza, levando a encarar a outra luz a
dita “caça às fortunas”. Mas nota-se também um movimento científico e social em
direcção ao conhecimento das origens, com desenvolvimentos da genética, nos
últimos vinte anos, que têm acentuado a importância dos vínculos biológicos
(mesmo se, porventura, com exagero no seu determinismo). O desejo de conhecer a
ascendência biológica tem sido tão acentuado, que se assiste a movimentações no
sentido de afastar o segredo sobre a identidade dos progenitores biológicos,
mesmo para os casos de reprodução assistida (cuja consideração está,
evidentemente, fora do âmbito do presente recurso), tendo até, entre nós, sido
já aprovada uma proposta de lei (a Proposta n.º 135/VII, in Diário da Assembleia da República, I
série, n.º 95 de 18 de Junho de 1999, págs. 3439-3440 e 3459-3460) que previa a
possibilidade de as pessoas nascidas em resultado da utilização de técnicas de
procriação medicamente assistida obterem, após a maioridade, informações sobre
a identidade dos seus progenitores genéticos (só não tendo entrado em vigor por
ter sido objecto de veto político pelo Presidente da República).
Não deve, igualmente, ignorar-se
a valorização da verdade e da transparência, com a possibilidade de acesso a
informação e dados pessoais e do seu controlo, com a promoção do valor da
pessoa e da sua “auto-definição”, que inclui, inevitavelmente, o conhecimento
das origens genéticas e culturais. A partir de 1997, consagrou-se, aliás,
expressamente um “direito ao desenvolvimento da personalidade” no artigo 26.º
da Constituição (Paulo Mota Pinto, O
direito ao livre desenvolvimento da personalidade, in Portugal‑Brasil, ano 2000, Coimbra, 2000), comportando
dimensões como a liberdade geral de acção e uma cláusula de tutela geral da
personalidade. E, se tanto o pretenso filho como o suposto progenitor podem
invocar este preceito constitucional, não é excessivo dizer-se que ele “pesa”
mais do lado do filho, para quem o exercício do direito de investigar é indispensável para determinar as suas
origens.
Importa, porém, analisar
especificamente a procedência, hic et
nunc, das justificações avançadas para a exclusão do direito a investigar a
paternidade depois dos vinte anos de idade do pretenso filho.
15. Como se
disse, invocam-se, para justificar o regime
actual, os riscos de fraudes
decorrentes de um “envelhecimento das provas”.
Tal dificuldade de prova constituía uma justificação de peso,
frequentemente invocada, para a limitação temporal prevista na lei, desde logo,
porque contendia com a própria fiabilidade do resultado da acção, e,
consequentemente, com a credibilidade do resultado quanto à identidade pessoal
invocada.
Não parece,
porém, que esta justificação possa actualmente ser considerada relevante. É que
os avanços científicos permitiram o emprego de testes de ADN com uma
fiabilidade próxima da certeza – probabilidades bioestatísticas superiores a 99,5%
-, e, por esse meio, mesmo depois da morte é hoje muitas
vezes possível estabelecer com grande segurança a maternidade ou a paternidade.
Assim, a justificação relativa à prova perdeu
quase todo o valor, com a eficácia e a generalização das provas científicas,
podendo as acções ser julgadas com base em testes de ADN, que não envelhecem
nunca. Como salienta Guilherme de Oliveira, Caducidade…,
cit., pág. 11, “os exames podem fazer-se muitos anos depois da morte do suposto
pai, ou na ausência do pai! Morrem as testemunhas, mudam os lugares, é certo,
mas nada disso altera, verdadeiramente, o caminho que as acções seguem, e
hão-de seguir cada vez mais, no futuro”.
16. Não é, pois, o valor da certeza
objectiva da identidade pessoal que está em causa, mas antes a segurança para sujeitos ou pessoas
concretas – designadamente, o interesse do pretenso progenitor, que poderia ser
investigado, em não ver indefinida ou excessivamente protelada uma situação de
incerteza quanto à sua paternidade, bem como o interesse, sendo o caso, da paz
e harmonia da família conjugal constituída pelo pretenso pai, a que se junta o
argumento de que as acções de investigação visam frequentemente fins tão-só patrimoniais (de “caça à herança”).
Começando
por este último, também ele não pode deixar de ser visto a outra luz. Se já
anteriormente não era claro que acções antigas
fossem necessariamente intentadas contra honestos cidadãos, com uma finalidade
de cobiça, é certo que, hoje, quer o acesso ao direito quer a composição da
riqueza mudaram, podendo mesmo muitas acções que poderiam beneficiar da
imprescritibilidade decorrer hoje, provavelmente, entre autores e réus com
meios de fortuna não muito diversos, com formação profissional e um emprego –
Guilherme de Oliveira (ob. cit., pág. 11, nota 14) pergunta mesmo: “Seria
concebível, nas leis contemporâneas, ler: ‘O filho ilegítimo (…) presume-se
pobre, salvo prova em contrário…’, como se lia no art. 44.º, do Decreto n.º 2,
de 1910?”. E o móbil do investigante pode bem ser apenas esclarecer a existência
do vínculo familiar, chamar o progenitor a assumir a sua responsabilidade e
descobrir o lugar no sistema de parentesco para deixar de estar só. Isto, mesmo
em momentos em que não tenha pretensões patrimoniais, por não poder deduzir
pretensões de natureza alimentar e não ter ainda previsivelmente expectativas
sucessórias.
Acresce que
o argumento se situa num plano predominantemente patrimonial, não podendo ser decisivo ante o exercício de uma
faculdade personalíssima,
constituinte clara da identidade pessoal, como a de averiguar quem é o seu
progenitor. Pode, aliás, deixar-se em aberto a questão de saber se a motivação,
também patrimonial, da família do
pretenso progenitor merece maior apreço do que a do investigante, quando aquela
pretende “proteger” a herança, [face] à protecção deste último, por se afigurar
decisiva a impossibilidade de anular
totalmente a possibilidade de exercer o “direito pessoal” a conhecer o progenitor, a partir dos vinte anos, com
invocação de uma tal motivação de segurança patrimonial. Perante esta
diferença, verdadeiramente qualitativa, dos interesses em presença, afigura-se,
aliás, difícil que se possa sindicar a motivação do investigante – e, de toda a
forma, se a motivação censurável pode fundar limitações em casos extremos (a aplicação do instrumento do abuso do direito ou de outro
remédio expressamente previsto), não
legitimará por certo uma exclusão geral e
total do direito a investigar a
paternidade.
Poderá
aceitar-se que o argumento da segurança possa eventualmente justificar um prazo de caducidade da investigação
de paternidade. Mas o certo é que no presente caso está apenas em causa o
concreto prazo previsto no artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil, que conduz à
caducidade da acção logo a partir dos vinte anos de idade.
17. Quanto ao interesse do pretenso progenitor em não ver indefinida ou
excessivamente protelada a dúvida
quanto à sua paternidade, não pode, desde logo, deixar de observar-se que, se o
que está em questão é realmente a incerteza quanto à paternidade, esta pode
hoje, com grande segurança, ser logo eliminada, com a concordância do próprio
pretenso progenitor que nisso estiver realmente interessado, bastando, para
tal, aceitar a realização de um vulgar teste genético de paternidade.
Não deve sobrevalorizar-se, no
confronto com bens constitutivos da personalidade, a garantia de “segurança
jurídica”, que releva sobretudo no âmbito patrimonial. Note‑se que a
ordem jurídica não mostra uma preocupação absoluta com a segurança patrimonial
dos herdeiros reconhecidos do progenitor, podendo qualquer herdeiro preterido
intentar acção de “petição da herança”, a todo o tempo, com sacrifício de quem
tiver recebido os bens (artigo 2075.º do Código Civil).
E, de qualquer modo, pode
duvidar-se de que o pretenso progenitor mereça uma protecção da segurança da
sua vida patrimonial que justifique a regra de exclusão do direito do
investigante, logo a partir dos vinte anos e sem consideração de outras
circunstâncias, a saber que é o seu pai. É que não pode conceder-se a uma
certeza ou segurança patrimonial de
outros filhos, ou do pretenso progenitor, relevância decisiva para excluir o
direito, eminentemente pessoal e que
integra uma dimensão fundamental da personalidade, a saber quem é o pai ou a
mãe biológicos.
Na verdade,
afigura-se que a pretensão de satisfazer, através do sacrifício do direito do
filho a saber quem é o pai, um puro interesse na tranquilidade – em “ser
deixado em paz” – ou na eliminação rápida de dúvidas – em resolver o assunto –
não é digna de tutela, se se tratar
realmente do progenitor. Este tem uma responsabilidade para com o filho que
não deve pretender extinguir pelo decurso do tempo, logo que aquele completa 20
anos, pela simples invocação de razões de segurança, confiança ou comodidade. E
se, diversamente, não se tratar do verdadeiro progenitor, pode, como se disse,
submeter-se a um teste genético sem nada a temer. Retomando as palavras de Guilherme de Oliveira (ob. cit.,
pág. 10), “se o suposto progenitor julga que é o progenitor, está nas suas mãos
acabar com a insegurança – perfilhando – e se tem dúvidas pode mesmo promover a
realização de testes científicos que as dissipem; se, pelo contrário, não tem a
consciência de poder ser declarado como progenitor, não sente a própria insegurança.
E se for um dia surpreendido pelas consequências de um ‘acidente’ passado há
muito tempo, dir-se-á que tem sempre o dever de assumir as responsabilidades,
porque mais ninguém o pode fazer no lugar dele.”
Também a circunstância, aduzida
em defesa do regime actual, de o
estabelecimento da filiação alegadamente dever ter lugar quando é mais
necessário, e pode ser mais útil para o filho, não pode considerar-se decisiva,
desde logo, porque – mesmo aceitando a lógica “assistencial” deste argumento –
o dever de prestação de alimentos pelos pais aos filhos se prolonga bem para
além da maioridade. E, de qualquer forma, a apreciação da conveniência em
determinar a identidade do seu progenitor, como elemento da sua identidade
pessoal, corresponde a uma faculdade eminentemente pessoal, em que apenas pode
imperar o critério do próprio filho,
e não qualquer “interpretação” externa do seu interesse ou utilidade deste na
investigação da paternidade.
E também não se vê que
possa só por si a protecção do interesse na paz e harmonia da família conjugal que pode ter sido constituída pelo pretenso
pai, considerar-se decisiva. Ao que acresce especificamente, ainda, que o investigado casado não deve ou pode
seguramente receber, por esse facto, maior protecção contra potenciais
investigantes do que o solteiro. Tal tratamento desigual baseia-se numa
circunstância irrelevante para o fim visado pelo investigante, com a acção de
investigação de paternidade, para além de tais limitações específicas ao
direito de agir contra supostos progenitores casados (ao tempo do nascimento ou
apenas no momento do reconhecimento), embora com antecedentes no nosso sistema
jurídico, se traduzirem em efeitos discriminatórios, constitucionalmente
vedados, contra os filhos concebidos fora do casamento.
É certo que o investigado poderá também invocar direitos
fundamentais, como o “direito à reserva da intimidade da vida privada e
familiar” (ou, mesmo, também, como se disse, o direito ao desenvolvimento da
personalidade), que poderão ser afectados pela revelação de factos que o possam
comprometer. Não se vê, porém, que se possa proteger tais interesses do
eventual progenitor à custa do direito de investigar a própria paternidade. Uma
alegada “liberdade-de-não-ser-considerado-pai”, apenas por terem passado muitos
anos sobre a concepção, ou um interesse em eximir-se à responsabilidade
jurídica correspondente, determinada fundamentalmente pelo “princípio da
verdade biológica” que inspira o nosso direito da filiação, não podem
considerar-se dignos de tutela, pelo menos, a ponto de sacrificar o direito do
filho a apurar e ver judicialmente declarado que é o seu pai (e lembre-se,
aliás, que como se disse, não é de excluir que se possa chegar, mesmo fora de um processo judicial, mediante
exames realizados no próprio Instituto Nacional de Medicina Legal, à conclusão
de que certa pessoa é progenitora de outra, ficando, porém, a verdade biológica
sem relevância simplesmente porque o progenitor não pretende perfilhar e o
filho já completou vinte anos).
18. Pode, pois, concluir-se que o regime
em apreço, ao excluir totalmente a possibilidade de investigar judicialmente a
paternidade (ou a maternidade), logo a partir dos vinte anos de idade, tem como
consequência uma diminuição do alcance do conteúdo
essencial dos direitos fundamentais à identidade pessoal e a constituir
família, que incluem o direito ao conhecimento da paternidade ou da
maternidade.
Neste ponto, não pode ignorar-se,
desde logo, que o prazo de dois anos em causa se esgota normalmente num momento
em que, por natureza, o investigante não é ainda, naturalmente, uma pessoa
experiente e inteiramente madura (constatação que não é contrariada, nem pelo
limite legal para a aquisição de capacidade de exercício de direitos, nem,
muito menos, pela previsão legal de uma tutela geral da personalidade, no seu
potencial de aperfeiçoamento). E, sobretudo, que tal prazo pode começar a
correr, e terminar, sem que existam quaisquer
possibilidades concretas de – ou apenas justificação para – interposição da
acção de investigação de paternidade, seja por não existirem ou não serem
conhecidos nenhuns elementos sobre a identidade do pretenso pai (os quais só
surgem mais tarde), seja simplesmente por, v.g., no ambiente social e familiar
do filho ser ocultada a sua verdadeira paternidade, ou não existir justificação
para pôr em causa a paternidade de quem sempre tenha tratado o investigante
como filho (sem, todavia, que a paternidade deste esteja estabelecida e venha a
ser impugnada, como aconteceu no caso que deu origem ao julgamento de
inconstitucionalidade proferido no acórdão n.º 456/2003).
Logo por esta razão, portanto, se
conclui que o prazo de dois anos é inconstitucional, por violação dos artigos
26.º, n.º 1, 36.º, n.º 1, e 18.º, n.º 3, da Constituição.
19. Mesmo,
porém, que se negasse uma verdadeira afectação
do conteúdo essencial dos direitos referidos, por se entender que podem
ainda restar (pelo menos, na maioria dos casos) certas possibilidades
investigatórias ao filho, afigura-se, também logo no plano da sua justificação – que não já apenas no dos
efeitos –, que a solução em causa não pode, hoje, ser considerada
constitucionalmente admissível, por violação da exigência de proporcionalidade (lato sensu) consagrada no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição.
É que, pelo menos no actual
contexto, tal regime passou a traduzir uma apreciação manifestamente incorrecta dos interesses ou valores em presença, em
particular, quanto à intensidade e à natureza das consequências que esse regime
tem para cada um destes: não só os prejuízos, designadamente não patrimoniais,
que advêm da perda, aos vinte anos de
idade, do direito a saber quem é o pai, se apresentam claramente desproporcionados em relação às desvantagens
eventualmente resultantes, para o investigado e sua família, da acção de
investigação (quer esta proceda – caso em que só será mais evidente a falta de
justificação para invocar estes interesses –, quer não), como são possíveis,
como se disse, alternativas, quer
ligando o direito de investigar às reais e concretas possibilidades
investigatórias do pretenso filho, sem total imprescritibilidade da acção (por
exemplo, prevendo um dies a quo que
não ignore o conhecimento ou a cognoscibilidade das circunstâncias que
fundamentam a acção), quer para obstar a situações excepcionais, em que,
considerando o contexto social e relacional do investigante, a invocação de um
vínculo exclusivamente biológico possa ser abusiva, não sendo de excluir,
evidentemente, o tratamento destes casos-limite com um adequado “remédio”
excepcional (seja ele específico – cfr. o regime referido do Código Civil de
Macau – ou geral, como o abuso do direito, considerando-se ilegítimo desprezar
os efeitos pessoais a ponto de se considerar a paternidade como puro interesse
patrimonial, a “activar” quando oportuno).»
4.Como
acima se referiu, esta fundamentação foi confirmada pelo acórdão n.º 11/05 e
sufragada pelas decisões sumárias n.ºs 114/05 e 288/05.
É esta a orientação que o Tribunal acolhe no presente
pedido de declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral e que
permite concluir, sem necessidade de considerações adicionais, pela
inconstitucionalidade da norma questionada, remetendo, como fundamentação, para
a do acórdão n.º 486/04, supra
transcrita.
III. Decisão
Com estes fundamentos, o Tribunal Constitucional decide declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, aplicável por força do artigo 1873.º do mesmo Código, na medida em que prevê, para a caducidade do direito de investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maioridade do investigante, por violação das disposições conjugadas dos artigos 26.º, n.º 1, 36.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.
Lisboa, 10
de Janeiro de 2006
Paulo Mota
Pinto
Benjamim
Rodrigues
Gil Galvão
Maria João
Antunes
Vítor
Gomes
Mário José
de Araújo Torres
Carlos
Pamplona de Oliveira
Maria
Helena Brito
Maria
Fernanda Palma
Rui Manuel
Moura Ramos
Maria dos
Prazeres Pizarro beleza (com declaração)
Artur
Maurício
Declaração de voto
Votei a declaração de inconstitucionalidade com força
obrigatória geral – e não o acórdão n.º 11/2005, do qual me distanciei pelas
razões constantes da declaração de voto que então juntei –, porque a entendo
como apenas julgando censurável a fixação
de um prazo impreterível de dois anos para a caducidade do direito de propor a
acção, e como não impedindo, nos casos de fiscalização concreta,
julgamentos de não inconstitucionalidade como o que foi proferido no acórdão
n.º 525/2003, de que fui relatora, no qual foi tomado em conta, nomeadamente, o
prazo decorrido entre a data em que o investigante atingiu a maioridade e a
data da propositura da acção de investigação.
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza